Alterações de sono nos transtornos mentais

A relação entre o sono e os transtornos mentais é bastante complexa. Entenda melhor como o sono afeta o tratamento dos transtornos aqui!
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A relação entre transtornos mentais e alterações de sono é bastante complexa. Em alguns transtornos, as alterações do sono fazem até parte dos critérios diagnósticos. Muitas vezes, tratar o sono antes de tratar o transtorno mental pode ajudar a aliviar significativamente os sintomas.

Neste artigo, você irá descobrir os efeitos do sono em diversos transtornos mentais, bem como de que forma as alterações do sono afetam o tratamento destes transtornos.

Índice

  1. Depressão;
  2. Transtorno afetivo bipolar (TAB);
  3. Transtorno de ansiedade generalizada (TAG);
  4. Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT);
  5. Esquizofrenia;
  6. Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).

Depressão

Dentre os critérios diagnósticos para o transtorno depressivo maior, estão a insônia ou hipersonia (dormir mais do que o adequado). Estas alterações de sono se apresentam em 90% dos casos de transtorno depressivo maior.

As principais alterações apresentadas pelas pessoas com depressão são:

  • Dificuldade em pegar no sono;
  • Dificuldade em se manter dormindo (acordar com frequência durante a noite);
  • Qualidade de sono insuficiente;
  • Pesadelos;
  • Sonolência durante o dia.

Estudos feitos com polissonografias (exames feitos para analisar a qualidade do sono) mostram que pessoas com depressão têm alterações nos estágios do sono. Muitas destas alterações estão relacionadas ao sono REM, uma fase do sono na qual a atividade cerebral é bastante intensa e que é responsável pelo processamento das informações adquiridas durante o dia, a consolidação de memórias, entre outros.

Apesar de estes problemas de sono serem bem conhecidos, eles não necessariamente indicam um transtorno depressivo maior, tendo em vista que estes mesmos problemas aparecem como sintomas em outros transtornos mentais.

Contudo, estudos indicam que pessoas saudáveis que apresentam insônia ou hipersonia têm 10 vezes mais chances de acabar desenvolvendo um episódio de depressão maior.

No tratamento

De acordo com o modelo de sintomas, no qual a insônia ou hipersonia seriam sintomas da depressão, estas alterações do sono deveriam melhorar à medida em que o tratamento para depressão é feito.

No entanto, cerca de 20 a 44% das pessoas diagnosticadas com transtorno depressivo maior continuam tendo alterações de sono mesmo com o tratamento, ainda que menos intensas.

Esse fenômeno é chamado de insônia ou hipersonia residual e geralmente está ligado a maiores chances de recaídas no tratamento, bem como um grande número de prejuízos cognitivos como dificuldades de concentração, diminuição da performance e sonolência.

Pessoas que apresentam um sono de qualidade insatisfatória também apresentam uma resposta mais lenta ao tratamento, bem como apresentam menos remissão dos sintomas quando comparados a pacientes que não apresentam alterações do sono. Além disso, essas alterações de sono estão ligadas a uma pior qualidade de vida em pessoas com depressão, independente da severidade dos sintomas.

Estudos mostram também que alterações de sono em pessoas com transtorno depressivo maior está ligado a um aumento da ideação suicida, das tentativas de suicídio e até mesmo dos suicídios completos.

Transtorno afetivo bipolar (TAB)

Frequentemente chamado apenas de transtorno bipolar ou bipolaridade, o TAB é caracterizado por episódios depressivos e maníacos.

Nos episódios depressivos, os sintomas apresentados são os mesmos de um episódio de depressão maior. Já os episódios maníacos possuem uma sintomatologia própria e diferente de outros transtornos, tendo uma relação bastante complexa com o sono.

Dentre os critérios diagnósticos para um episódio maníaco, está uma necessidade de sono reduzida, mas ainda mantendo energia e disposição durante o dia.

Vale ressaltar que “necessidade de sono reduzida” não significa insônia. Na insônia, a pessoa tem sono e vontade de dormir, mas simplesmente não consegue, e isso traz prejuízos como sonolência durante o dia, indisposição, entre outros. Já na mania, a pessoa realmente não sente vontade de dormir e, mesmo assim, sente-se energizada e bem disposta grande parte do tempo.

Contudo, em fases depressivas, é comum o aparecimento da hipersonia.

Pessoas com diagnóstico de transtorno bipolar também apresentam mais chances de apresentar um episódio maníaco caso fiquem muito tempo sem dormir direito. É como se a falta de sono fosse um gatilho para o episódio maníaco, que por sua vez diminui a necessidade de sono, formando uma espécie de ciclo vicioso.

No tratamento

Não existem muitos estudos acerca do sono no tratamento do transtorno bipolar. No entanto, o uso de medicamentos antipsicóticos e estabilizadores de humor pode aliviar essas alterações do sono.

Além disso, tratamentos psicoterapêuticos podem ajudar a desenvolver uma higiene de sono que auxilia no combate a essas alterações, ajudando a melhorar as ciclagens (momento em que a pessoa sai de um episódio e vai para outro episódio de humor).

Transtorno de ansiedade generalizada (TAG)

O transtorno de ansiedade generalizada é caracterizado por uma ansiedade excessiva e frequente nos últimos 6 meses. Um dos critérios do transtorno é “sono perturbado”.

Metade das pessoas diagnosticadas com TAG apresentam dificuldade para pegar no sono ou dificuldade em se manter dormindo. Além disso, existem evidências de que pessoas com insônia têm mais chances de desenvolver transtornos de ansiedade quando comparadas a pessoas saudáveis.

No tratamento

Estudos feitos com medicamentos para tratar insônia junto com medicamentos para tratar a ansiedade mostram que, quando a pessoa trata tanto a insônia quanto a ansiedade, o tratamento de TAG tende a demonstrar eficácia mais rápido, diminuindo o tempo até a remissão dos sintomas.

Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT)

O transtorno de estresse pós-traumático é uma condição que surge depois que uma pessoa vivencia uma situação na qual tem a sua vida ou a vida de pessoas amadas ameaçadas, podendo resultar em morte ou não. O mesmo vale para ferimentos graves.

Em geral, a pessoa que sofre de TEPT fica relembrando os acontecimentos de modo intrusivo, ou seja, a lembrança não vem de forma voluntária, mas sim “do nada”, e causa angústia intensa.

Dentre os sintomas do TEPT, está a hipervigilância, um estado no qual a pessoa está muito alerta e atenta aos seus arredores. Isso pode causar prejuízos na hora de dormir, fazendo com que a pessoa tenha dificuldade para pegar no sono ou manter-se dormindo.

Pesadelos também são comuns, o que pode levar a pessoa a acordar repentinamente no meio da noite e ter dificuldade para voltar a dormir.

No tratamento

Estudos mostram que fazer um tratamento medicamentoso para insônia em pessoas com TEPT ajuda a melhorar os sintomas do transtorno durante o dia. No entanto, não se sabe se isso ocorre de forma direta ou se a pessoa tem menos sintomas durante o dia simplesmente porque está dormindo melhor à noite.

Não há evidências de que tratamentos comportamentais, como desenvolver uma boa higiene de sono, pode auxiliar a diminuir os sintomas de TEPT durante o dia.

Esquizofrenia

Embora não haja nada relacionado a sono nos critérios diagnósticos de esquizofrenia, muitos dos pacientes apresentam reclamações relacionadas ao sono.

Não é raro que pacientes com esquizofrenia apresentem alterações no ritmo circadiano, popularmente conhecido como “relógio biológico”. O ritmo circadiano é quem dita os processos no organismo, controlando os horários de dormir, comer, entre outros.

Frequentemente, as pessoas diagnosticadas com esquizofrenia apresentam alterações neste ritmo, resultando em um sono maior na parte do dia e maior energia para ficar acordado durante a noite.

Além disso, pessoas com esquizofrenia têm mais chances de apresentar os chamados distúrbios do sono quando comparadas à população geral.

Estudos mostram que o sono parece ter um grande impacto nos sintomas da esquizofrenia. Pessoas com mais problemas de sono tendem a ter uma piora nos sintomas. Já uma boa qualidade de sono está associada a uma melhor qualidade de vida em pessoas diagnosticadas com esquizofrenia.

Os problemas de sono geralmente aparecem logo antes de um episódio de agravamento dos sintomas psicóticos. Contudo, não se sabe exatamente se estes problemas de sono agem como causadores desse agravamento ou se eles seriam um primeiro sintoma de uma descompensação.

No tratamento

Grande parte dos medicamentos usados para tratar esquizofrenia também tem um efeito de sedação, o que pode levar a sonolência diurna e prejudicar ainda mais o funcionamento de pessoas diagnosticadas com esse transtorno.

Contudo, nos pacientes que apresentam dificuldades com o sono, este tratamento pode ser benéfico. Ainda assim, é necessário cautela, pois a lenta absorção destes medicamentos pode causar sonolência diurna sem necessariamente melhorar a qualidade do sono durante a noite.

Além disso, grande parte destes medicamentos também tem como efeito colateral o ganho de peso, que também pode prejudicar a qualidade do sono.

Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)

Problemas de sono também não são critério diagnóstico para TDAH, mas estima-se que entre 25 a 50% das pessoas com esse transtorno apresentam problemas para dormir.

Mesmo aquelas pessoas com uma maior hiperatividade durante o dia podem apresentar pensamentos rápidos e maior energia durante a noite, prejudicando seu sono.

Os chamados “hiperfocos”, momentos nos quais a pessoa consegue se concentrar em uma tarefa e negligencia os demais estímulos (mesmo aqueles importantes, como a fome, a vontade de ir ao banheiro etc.) também podem contribuir para negligenciar o sono.

O problema é que um sono de má qualidade tende a piorar os sintomas do TDAH, deixando a pessoa ainda mais esquecida, com menos capacidade de controlar impulsos e até mesmo mais hiperativa.

A presença de comorbidades comuns ao TDAH, como a depressão, a ansiedade e o abuso de substâncias, por exemplo, também podem contribuir para noites mal dormidas.

Por fim, pessoas com TDAH também têm mais chances de desenvolver distúrbios do sono quando comparadas à população geral.

No tratamento

O tratamento para problemas de sono em pessoas com TDAH pode ser diferente, tendo em vista que medicações que induzem o sono podem não ser uma boa alternativa, tendo em vista que o tratamento do transtorno é feito primariamente com medicamentos estimulantes. Em suma, uma medicação cancelaria o efeito da outra e isso tornaria o tratamento contraproducente.

Por isso, é importante que a pessoa com TDAH desenvolva estratégias para dormir mais cedo e pratique bons hábitos de higiene de sono a fim de assegurar uma melhor noite de sono. Um médico especialista em sono ou um psicoterapeuta com foco em comportamento podem auxiliar no desenvolvimento dessa rotina.

O sono é uma das coisas mais importantes para o nosso organismo e, portanto, qualquer problema nesta atividade pode trazer uma série de consequências para a saúde física e mental. Quando a pessoa possui um diagnóstico de transtorno mental, a atenção para o sono deve ser redobrada devido à complexidade da relação entre o sono e os transtornos mentais.

Se você suspeita de ter algum transtorno e percebe que tem dificuldades para dormir, não hesite em conversar com um bom profissional que compreenda o impacto do sono na saúde mental.

Referências

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3493205/

https://www.sleepfoundation.org/mental-health/adhd-and-sleep

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