O transtorno de espectro autista (TEA) traz uma série de limitações que podem prejudicar o desenvolvimento do indivíduo. Os impactos variam, podendo ter influência sobre o desenvolvimento da linguagem, das relações interpessoais, do aprendizado, entre outros. Além disso, trata-se de um transtorno que não tem cura, ou seja, a pessoa tende a lidar com os sintomas pelo resto da vida.
Isso não significa, no entanto, que ela está fadada a viver com tais limitações. Felizmente, existem tratamentos que podem ajudar o indivíduo a desenvolver habilidades que trazem qualidade de vida. O foco do tratamento é a minimização dos sintomas e maximização das habilidades, fazendo com que o impacto dessas limitações seja significativamente menor.
É válido lembrar que não existe um tratamento específico padronizado para o transtorno de espectro autista. Cada pessoa manifesta o autismo de forma diferente e, portanto, o tratamento deve ser feito “sob medida”, buscando aproveitar as habilidades que o indivíduo já tem e desenvolver novas de acordo com suas necessidades.
Muitas pessoas com TEA conseguem evoluções por meio de programas e intervenções terapêuticas, independente da idade do diagnóstico e do início do tratamento. Contudo, quanto mais cedo a pessoa inicia o processo, melhores os resultados.
A maior parte das pessoas com autismo respondem melhor a programas altamente estruturados e especializados, ou seja, é necessário uma boa estruturação das intervenções baseadas nas necessidades e limitações de cada indivíduo.
Na grande maioria dos casos, o tratamento é focado no desenvolvimento de habilidades sociais (especialmente nas idades em que se espera que crianças neurotípicas adquiram essas habilidades), redução dos interesses restritos (em outras palavras, aumentar o leque de interesses do indivíduo) e diminuir a frequência de comportamentos repetitivos (como estereotipias, por exemplo) e comportamentos que podem ser problemáticos.
Análise do comportamento aplicada (ABA)
Um dos principais protocolos de tratamento para o autismo é o ABA. Do inglês Applied Behavior Analysis, a ABA é um termo guarda-chuva para uma série de intervenções baseadas na análise do comportamento. Estas intervenções buscam reforçar comportamentos desejados e diminuir a frequência dos comportamentos indesejados.
O ABA é baseado na análise do comportamento (ou behaviorismo), uma corrente da psicologia que estuda o comportamento humano, como ele ocorre, como modificá-lo etc. Para isso, ele conta com a tríplice contingência, que é uma análise do comportamento e sua relação com seus antecedentes e consequências.
Em suma, todo comportamento possui um antecedente que o desencadeia. O comportamento de beber água, por exemplo, requer os seguintes antecedentes: necessidade de beber água (sede) e acesso à água.
Beber água também possui algumas consequências, dentre elas, saciar a sede — o que conta como um reforço para o comportamento de beber água, ou seja, aumenta a tendência da pessoa repetir o comportamento de beber água quando sentir sede novamente.
Essa “quebra” do comportamento em partes (antecedentes, comportamento propriamente dito e consequências) permite que o comportamento seja estudado e moldado de acordo com as necessidades de cada indivíduo.
Com frequência, o repertório comportamental de uma pessoa com TEA é limitado e, portanto, ela age de maneira considerada “esquisita” ou inadequada para as situações (em especial as situações sociais). Tendo isso em mente, o ABA busca modificar os comportamentos problema, almejando um comportamento mais adaptado (ou seja, que traga menos prejuízos) e desenvolver novos comportamentos desejáveis, como por exemplo o comportamento de iniciar uma conversa.
O ABA pode ser aplicado em uma grande variedade de situações: em casa, no consultório, na escola, na comunidade, entre outros. Os familiares, pais ou responsáveis também aprendem algumas técnicas para ajudar no tratamento em casa.
Dentro da ABA, existem algumas técnicas específicas de ensino, como:
Discrete Trial Training (DTT)
O discrete trial training, ou treinamento por tentativas discretas em tradução livre, utiliza de séries de tentativas de cada passo do comportamento desejado.
Em outras palavras, o comportamento desejado é ensinado por partes, e em várias tentativas. Quando a pessoa faz aquilo que é esperado, ela é reforçada. Já quando faz algo que não deveria, o comportamento é ignorado.
Early Intensive Behavioral Intervention (EIBI/EIBT)
A intervenção comportamental intensiva precoce, em tradução livre, é um tratamento que tem início antes dos 5 anos de idade, até mesmo antes dos 3.
Através de uma abordagem bem estruturada de aprendizagem, o objetivo da EIBI é desenvolver comportamentos positivos, como a comunicação social, e reduzir comportamentos problemáticos, como birras, agressões e comportamentos que podem causar ferimentos no indivíduo.
Early Start Denver Model (ESDM)
O ESDM é um programa de intervenções ainda mais precoce que o EIBI, sendo indicado para crianças entre 12 e 48 meses de idade. Como nessa idade a criança ainda é extremamente dependente dos pais, a terapia é feita em conjunto com os pais e visa dar uma base inicial para a elaboração posterior das habilidades sociais, cognitivas e de linguagem.
Pivotal Response Training (PRT)
PRT é um programa mais focado na motivação do indivíduo, trabalhando a motivação para aprender, a monitoração do próprio comportamento, bem como instiga a iniciativa da comunicação, ou seja, ajuda o indivíduo a iniciar interações sociais — o que, muitas vezes, é um desafio para pessoas no espectro autista.
Tecnologias de assistência
Além dos programas e intervenções psicoterapêuticas, a pessoa com TEA pode se beneficiar de tecnologias de assistência. Algumas pessoas não chegam a desenvolver a fala, mas podem utilizar equipamentos como sintetizadores de voz para se comunicar com os outros. O uso de cartões com imagens podem auxiliar pessoas que não desenvolvem a comunicação verbal.
Terapia ocupacional
A terapia ocupacional é um tipo de terapia que tem como objetivo auxiliar a pessoa a viver da maneira mais independente quanto possível. Trata-se de uma terapia para qualquer tipo de deficiência ou limitação que uma pessoa venha a ter. Embora não seja um tratamento focado no autismo, ela pode ajudar bastante pessoas dentro do espectro, dependendo do caso.
A terapia ocupacional foca em atividades que para grande parte das pessoas são simples e podem ser realizadas sem a ajuda de outros, como alimentação, higiene, vestir roupas, entre outros. No caso de pessoas com limitações, essas atividades podem necessitar da ajuda de outras pessoas. Com a terapia ocupacional, espera-se realizar adaptações nessas atividades para que a pessoa seja o mais autônoma possível nessas atividades.
Embora o diagnóstico de transtorno de espectro autista traga consigo uma série de incertezas acerca dos impactos que ele terá no desenvolvimento da pessoa, mas existem intervenções capazes de ajudar bastante no tratamento, fazendo com que o indivíduo desenvolva habilidades e consiga levar uma vida de qualidade.
Se você conhece alguém ou acredita que algum familiar sofre de TEA, não hesite em entrar em contato com um profissional da saúde mental de confiança!
Referências
https://www.cdc.gov/ncbddd/autism/treatment.html
https://www.webmd.com/brain/autism/understanding-autism-treatment