O SARS-CoV-2, vírus causador da pandemia de COVID-19, ainda é um tanto quanto misterioso. Inicialmente, acreditava-se tratar de uma doença exclusivamente respiratória. Aos poucos, cientistas e profissionais da saúde no mundo inteiro identificaram novos sintomas que indicavam que a doença não só afetava o sistema respiratório, como também o sistema circulatório e até mesmo o sistema nervoso central (SNC).
O primeiro sintoma identificado que poderia indicar uma ação do vírus no sistema nervoso central foi a perda do olfato, ou seja, a perda da capacidade de sentir cheiros. Em seguida, foram aparecendo mais sintomas relacionados ao SNC, como AVCs e outras complicações neurológicas.
De acordo com Robert Stevens, médico de UTI no hospital John Hopkins nos Estados Unidos, existem muitas evidências de que pacientes internados em UTIs vivenciam uma série de sintomas neurológicos, cognitivos, psicológicos e psiquiátricos. Dentre eles, o delírio que, segundo Stevens, praticamente todos os pacientes internados na UTI vivenciam.
Ainda não se sabe exatamente a extensão destes sintomas, tanto em severidade quanto em quantidade de pacientes atingidos, tendo em vista que casos mais leves da doença não necessitam internação e, portanto, tais sintomas não são observados ou reportados.
O que alguns estudos dizem
Existem alguns estudos que, embora não possam ser generalizados, trazem alguma ideia do efeito que a COVID-19 pode ter sobre o cérebro.
Um estudo feito na Universidade de Liverpool por Mark Ellul e colegas analisou 901 relatos de casos nos quais identificaram os seguintes sintomas neurológicos:
- Perda de olfato e paladar;
- Confusão;
- Encefalite (inflamação do cérebro);
- Síndrome de Guillain-Barré, na qual o sistema imunológico ataca os nervos.
Já um estudo publicado no periódico científico New England Journal of Medicine indica que 67% dos pacientes demonstram sintomas neurológicos. O estudo foi feito na França e contava com uma amostra de 58 pacientes.
Sintomas neurológicos são comuns?
Embora ainda existam poucas pesquisas acerca dos sintomas neurológicos causados pela COVID-19, já está claro que não se trata de uma ocorrência rara. Pesquisadores suspeitam que entre 30 e 50% dos pacientes internados apresentam quadros neurológicos além do quadro respiratório.
Os sintomas neurológicos mais comuns em pacientes internados são delírio e acidente vascular cerebral (AVC), porém outros sintomas que aparecem com certa frequência são dores de cabeça, tontura, fraqueza, confusão, problemas no movimento do olho, convulsões e paralisia.
Acredita-se também que casos mais graves de COVID-19 tenham maior tendência a apresentar sintomas neurológicos. Não se sabe a prevalência de sintomas neurológicos em pessoas com casos leves, que não são hospitalizadas.
Como a COVID-19 age no cérebro?
Não há dúvidas que a doença causa sintomas neurológicos, mas os pesquisadores ainda estão tentando entender de que forma esses sintomas surgem, ou seja, qual a atuação específica do vírus no sistema nervoso central para que tais quadros apareçam.
Algumas das hipóteses mais discutidas atualmente são:
Complicações da UTI
Pessoas que estão internadas na UTI têm maiores chances de desenvolver sintomas neurológicos e cognitivos, independente do motivo que estão internadas.
Pesquisas realizadas antes do surgimento do novo coronavírus mostram que cerca de 20-40% dos pacientes internados em UTI apresentam delírio, sendo que este número sobre para 60-80% quando os pacientes estão utilizando ventilação mecânica.
Isso indica que a presença de alguns sintomas neurológicos não necessariamente são causados pela COVID-19, mas sim pela condição de estar internado em uma UTI.
Resposta imune ou inflamatória
Aparentemente, a COVID-19 é capaz de desencadear uma resposta imune que causa problemas em diversas partes do corpo, dentre elas o cérebro.
Paterson e colegas publicaram na revista científica Brain um estudo que descreve uma série de tipos de encefalites (inflamações no cérebro) em pacientes infectados com o coronavírus, bem como encefalomielite disseminada (inflamação do cérebro e da medula espinal) e a presença de uma disfunção autoimune na qual o próprio sistema imunológico ataca células saudáveis do cérebro.
Nos casos mais leves de inflamação cerebral, o paciente pode apresentar sintomas parecidos com um resfriado, como dores de cabeça, febre, fadiga, entre outros. Já em casos mais graves, sintomas mais severos são encontrados, como confusão, convulsões, paralisia, afasia (dificuldade na fala), dificuldade de audição, entre outros.
Acidente vascular cerebral (derrame)
Além dos sintomas respiratórios, a COVID-19 também forma coágulos no sangue, tanto grandes quanto pequenos, que podem viajar pela corrente sanguínea até parar no cérebro, onde acabam causando um acidente vascular cerebral.
É importante ressaltar que o AVC tem ocorrido em pacientes de todas as idades, ou seja, a idade avançada não é um fator de risco para essa complicação, pois ocorre em todas as faixas etárias. De fato, muitas das pessoas vão ao hospital tendo sintomas leves da COVID-19, sendo o acidente vascular a primeira complicação aparente da doença.
Infecção viral no cérebro
Uma última possibilidade é que o próprio vírus infecte o cérebro. Contudo, isso ainda é debatido, tendo em vista que não se sabe exatamente como o vírus consegue ir parar no sistema nervoso central.
Já ocorreram casos em que o vírus apareceu em exames de líquido cefalorraquidiano, um líquido que irriga o cérebro, o que indica que o vírus pode infectar as células nervosas. Contudo, mesmo que isso ocorra, trata-se de algo extremamente raro.
Ao que tudo indica, a maior parte dos quadros de encefalite por coronavírus na realidade são quadros de inflamação por conta da resposta imune do que por uma infecção no cérebro de fato.
Evolução do quadro neurológico
Existem três estágios do quadro neurológico causado pela COVID-19. Entenda:
- Estágio 1: Danos limitados às células epiteliais do nariz e da boca, provocando a perda do olfato e paladar;
- Estágio 2: O vírus desencadeia uma resposta inflamatória que leva à formação de coágulos sanguíneos, que podem trafegar pela corrente sanguínea e causar acidentes vasculares cerebrais;
- Estágio 3: Uma resposta inflamatória repentina chamada “tempestade de citocinas” pode danificar a barreira entre sangue e cérebro, permitindo a entrada de células inflamatórias e até mesmo do vírus SARS-CoV-2 no sistema nervoso central, provocando uma infecção do próprio cérebro. Dentre os sintomas deste quadro, estão convulsões, confusão, coma e encefalopatia.
A COVID-19 é uma doença nova que ainda está sendo investigada e, a cada momento, a comunidade médica e científica identifica novos sintomas e sequelas que a doença pode causar. Tendo em vista que se trata de uma doença séria, que pode levar ao óbito mesmo pessoas fora do grupo de risco, prevenir-se é de extrema importância!
Lave bem as mãos com água e sabão e utilize máscara quando for necessário sair de casa!
Embora a pandemia não seja uma novidade, ela ainda tem sido um peso constante para a saúde mental de muitas pessoas. Se você acredita estar sofrendo com sintomas de ansiedade ou depressão em meio a esse momento, não hesite em entrar em contato com um psicólogo ou psiquiatra de confiança!
Referências