Desde o início da pandemia de COVID-19, em 2020, a questão da saúde mental foi colocada em pauta por conta do isolamento social. Embora grande parte das conversas tenham sido a respeito de pessoas adultas, a realidade é que crianças também sofreram os efeitos psicológicos desse momento complexo na vida de todos nós.
Dentre as dificuldades que as crianças tiveram que lidar durante este período estão a ansiedade e a imprevisibilidade na rotina, perda de membros familiares ou até mesmo abusos em casa que poderiam ser minimizados sem o isolamento.
Dados coletados nos Estados Unidos mostram que 71% dos pais e cuidadores relatam que a pandemia prejudicou significativamente a saúde mental de seus filhos. As visitas a departamentos de emergência em saúde mental aumentaram cerca de 24% para crianças entre 5 e 11 anos, e 31% para crianças e adolescentes entre 12 e 17 anos.
A falta de profissionais da saúde mental em ambiente escolar, bem como o afastamento desse ambiente, é um dos fatores que contribuem para uma crise na saúde mental de crianças e adolescentes, que deve ter um impacto duradouro, mesmo após o final da pandemia.
Saúde mental na infância: fatores de risco e proteção
No que tange a saúde mental infantil, existem alguns fatores de risco e alguns fatores de proteção. Dentre os fatores de risco estão:
- Fatores genéticos;
- Exposição à violência;
- Abusos psicológicos, físicos ou sexuais;
- Discriminação;
- Pobreza;
- Bullying;
- Qualidade das relações interpessoais;
- Acesso à educação;
- Crises humanitárias;
- Emergências de saúde.
Todos estes fatores podem contribuir para o desenvolvimento de algum tipo de transtorno mental posteriormente. No que tange a qualidade das relações interpessoais, pode-se pensar na relação não apenas com os pais e cuidadores primários, mas também com demais familiares, colegas de escola, entre outros.
Dentre os fatores de proteção, estão os cuidados amorosos por parte da família, segurança no ambiente escolar, relacionamentos positivos com os colegas da escola e demais familiares, acesso a profissionais da saúde mental, entre outros.
Como melhorar a saúde mental das crianças?
Como visto anteriormente, a saúde mental é afetada por um grande número de fatores, não sendo responsabilidade unicamente dos profissionais da saúde. No caso de crianças, existem diversas maneiras de abordar a saúde mental sem necessariamente encaminhar o indivíduo para um psiquiatra ou psicólogo. Dentre tais maneiras estão:
Abordar a saúde mental em ambiente escolar
É no ambiente escolar que ocorre grande parte do desenvolvimento das crianças e, por isso, ter um profissional de saúde mental presente neste ambiente seria fundamental para auxiliar para um desenvolvimento saudável. No entanto, a realidade está longe de ser assim.
Atualmente, no Brasil, existe um quadro de funcionários indispensáveis dentro de uma escola, tal qual diretor, professores, pedagogos, entre outros. No entanto, fora das escolas públicas, não há a obrigação de que exista um profissional da saúde mental em ambiente escolar.
Por conta disso, o cuidado com a saúde mental dentro das escolas geralmente recai sobre professores e pedagogos, que podem auxiliar por meio de atividades de psicoeducação.
Nessas atividades, os professores e pedagogos podem instruir as crianças em relação ao conceito de saúde mental, sinais de que as coisas não vão bem, assim como podem ensinar habilidades para lidar com frustrações emocionais e demais fatores que podem contribuir para o desenvolvimento de transtornos mentais a longo prazo.
Treinar professores para lidar com traumas
Diante da pandemia, o fenômeno do trauma se tornou um destaque nas discussões sobre saúde mental, sendo um dos maiores fatores que contribuem para prejuízos na saúde mental a longo prazo.
Por isso, é de suma importância que professores e pedagogos aprendam a lidar com manifestações de trauma por parte das crianças e adolescentes em sala de aula.
Muitas vezes, aquilo que é visto como malcriação dentro da sala de aula nada mais é do que uma manifestação de um trauma. Além disso, grande parte dos professores também possuem seus próprios traumas não trabalhados, o que acaba prejudicando a maneira com que lidam com as manifestações traumáticas de seus alunos.
Garantir resiliência a longo prazo
Embora a pandemia tenha trazido bastante atenção para a questão da saúde mental das crianças e adolescentes em idade escolar, a verdade é que realizar ações visando a saúde mental apenas nesse momento pode não ser o suficiente.
Os acontecimentos durante a infância e adolescência costumam ser os maiores preditores do desenvolvimento de transtornos mentais na vida adulta, portanto, atenção psicológica nesses momentos da vida pode ser crucial para a prevenção de prejuízos na saúde mental.
Segundo a UNICEF, até mesmo antes da pandemia havia uma porção significativa de crianças e adolescentes lidando com transtornos mentais sem que estes fossem tratados de alguma forma.
Neste sentido, é importante garantir o acesso de crianças e adolescentes à saúde mental em um contexto geral, mesmo após a pandemia ou quando não estão ocorrendo eventos de larga escala capazes de gerar traumas coletivos.
Isso pode ser feito promovendo atividades relacionadas à saúde mental nas escolas durante todo o ano letivo, bem como ensinando habilidades para lidar com frustrações, técnicas de comunicação e provendo a possibilidade de aconselhamento para aqueles que podem vir a necessitar.
Preparar pais e cuidadores para abordar a saúde mental
Os pais e cuidadores também devem ser instruídos em relação aos cuidados com a saúde mental das crianças e adolescentes, bem como sua própria saúde mental, pois pais e cuidadores com a saúde mental em dia auxiliam no desenvolvimento saudável dos pequenos.
Valorizar redes de apoio entre pares
Rede de apoio é um conceito fundamental no que tange a saúde mental e que não costuma ser muito estimulado. Uma rede de apoio é um grupo de conexões entre pessoas que estão dispostas a ajudar quando necessário.
A rede de apoio é formada por familiares, amizades, profissionais da saúde mental, entre outros. Em geral, quando se trata de infância e adolescência, a rede de apoio costuma ser formada mais pelos adultos responsáveis por essas crianças ou adolescentes.
Contudo, estimular a amizade como pontos de confiança com quem a criança ou adolescente pode contar quando necessário é importante tanto para a saúde mental como um todo como também para o bom desenvolvimento das relações nessa fase da vida.
Não é raro que adolescentes se isolem quando estão sendo acometidos por alguma questão de saúde mental e, portanto, o contato de qualidade com essas amizades pode ser de suma importância para melhorar o quadro do adolescente e prevenir uma piora na idade adulta.
Embora se fale muito de saúde mental na idade adulta, é geralmente na infância e na adolescência que aparecem os primeiros sinais de que algo não vai muito bem.
Se você é pai ou cuidador de uma criança ou adolescente que está apresentando sinais de alguma perturbação mental, lembre-se que nem sempre é só uma fase e, mesmo que seja, ter ajuda de profissionais da saúde mental nesses momentos é fundamental para evitar maiores problemas posteriormente!
Fonte
https://www.apa.org/monitor/2022/01/special-childrens-mental-health
https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/impacto-da-covid-19-na-saude-mental-de-criancas-adolescentes-e-jovens