Muito se fala sobre os efeitos de mídias sociais, jogos eletrônicos e todas as diversas atividades que a tecnologia pode nos proporcionar. Quando se trata de crianças e adolescentes, a discussão tende a ir para um lado negativo: mídias sociais estão relacionadas com depressão, jogos do tipo FPS (first-person shooter ou tiro em primeira pessoa) aumentam a violência e as pessoas estão cada vez mais distantes umas das outras, trocando as relações pessoais por relações virtuais.
Entretanto, uma nova pesquisa sugere que a realidade pode não ser tão ruim assim. Publicado na revista científica Nature Human Behaviour e desenvolvida na Universidade de Oxford, a pesquisa revela que os métodos estatísticos usados em várias dessas pesquisas possuem diversas armadilhas que alteram as interpretações dos resultados.
Analisando dados de mais de 350 mil adolescentes, os pesquisadores perceberam que, a nível populacional, os efeitos negativos da tecnologia não são significativos. Para chegar a essa conclusão, eles utilizaram questionários que mediam sintomas depressivos, ideação suicida, comportamento social, problemas de relacionamento com outros adolescentes, entre outras questões. O que os pesquisadores perceberam é que o uso de tecnologias poderia variar o nível de saúde emocional em menos de 0,5%. Para comparar, o uso de óculos possui um impacto emocional mais negativo em adolescentes do que o uso de tecnologias.
Qual o problema das pesquisas?
O maior problema dessas pesquisas em relação ao uso de tecnologias é que elas se baseiam em análises de conjuntos de dados enormes disponíveis publicamente, e a interpretação desses dados pode acabar sofrendo influências do viés do pesquisador. Resumindo: se o pesquisador acredita que o uso de tecnologias pode trazer consequências negativas para as pessoas, então é mais provável que ele interprete os dados de forma a corroborar com a sua afirmação inicial.
Para provar que isso é possível, os pesquisadores deste estudo mostraram que existem cerca de 600 milhões de possibilidades de analisar os três conjuntos de dados utilizados em suas pesquisas e, devido ao grande número de participantes, é muito fácil que pequenos efeitos (como os efeitos negativos do uso de tecnologias) sejam maximizados e causem alarde.
Basicamente, o que estes pesquisadores tentaram fazer foi colocar as coisas em perspectiva. Ao olhar isoladamente os resultados das pesquisas anteriores, tende-se a acreditar que é possível generalizar esses resultados. No entanto, ao pegar novamente esses dados e olhar as maneiras que eles podem ser analisados, pode-se ver que não se trata de algo tão grande assim. No caso, os efeitos da tecnologia podem até existir, eles só não são tão impactantes quanto as pesquisas fizeram parecer. É como se fossemos olhar a floresta inteira, e não apenas uma árvore.
O que isso realmente quer dizer?
Apesar de esse estudo parecer desqualificar todos os estudos anteriores a respeito de possíveis efeitos negativos do uso de tecnologias enquanto ainda na adolescência, não é bem assim que a banda toca. O que a pesquisa mostra é que, nessas pesquisas anteriores, houveram erros estatísticos que alarmaram pais, professores e demais educadores quando, na realidade, elas simplesmente não promoveram dados o suficiente para estabelecer uma relação forte e consistente entre esses efeitos negativos e o uso de tecnologias.
Isso não significa, no entanto, que as tecnologias não estão causando nenhum mal. Apenas foi possível perceber que, mesmo que exista alguma relação, ela não parece ser tão forte assim a ponto de justificar o alvoroço e a preocupação acerca desta questão. Em suma, parece que as crianças e adolescentes que se beneficiam da tecnologia dos dias atuais estão bem e nenhuma outra preocupação é necessária, contando que esse uso seja feito de forma adequada.
Vício em jogos e redes sociais
Como dito anteriormente, parece estar tudo bem com as crianças e adolescentes que usam a tecnologia de maneira adequada. O problema, na realidade, é quando se desenvolve uma relação não saudável com a tecnologia, especialmente quando se trata de um vício/dependência de jogos e redes sociais.
Trata-se de uma realidade que não se pode negar. Jogos eletrônicos e aplicativos de redes sociais são desenvolvidos seguindo princípios que reforçam o comportamento do usuário, ou seja, fazem com que a pessoa busque mais vezes o prazer de jogar ou usar as mídias sociais. Algumas pessoas, no entanto, são mais suscetíveis a esses princípios, de acordo com determinadas situações em suas vidas, e podem não perceber quando este comportamento já está ocorrendo em demasia e causando prejuízos.
Nesses casos, é necessário intervenção. Psicoterapias podem ser de grande ajuda. É importante lembrar, no entanto, que esse “vício” não é causado apenas pela tecnologia, mas também por outras questões que variam de indivíduo para indivíduo. Enquanto jogos e aplicativos se utilizam do conhecimento da psique humana para beneficiar seus negócios, a estratégia não é inteiramente culpada – a história pessoal de cada um, assim como as suas suscetibilidades específicas, têm grande influência nesse processo.
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Se você está passando muito tempo em redes sociais ou jogando e acha que precisa de ajuda, não se esqueça de contatar um psicólogo ou psiquiatra de confiança!
Referências
https://www.scientificamerican.com/article/the-kids-who-use-tech-seem-to-be-all-right/?redirect=1