Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC/tDCS) para depressão

Dentre os tratamentos neuromoduladores para depressão, um dos mais falados é a ETCC. Ela é mesmo eficaz? Entenda aqui!
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A depressão é um transtorno de humor que acomete entre 12 a 14% da população mundial, sendo prejudicial em diversas áreas pois pode tomar proporções debilitantes.

Embora hoje em dia existam muitos tratamentos para o transtorno, nem sempre eles funcionam de primeira e, portanto, é necessário buscar alternativas. É aí que entra a possibilidade de tratar a depressão com a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua.

O que é a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua?

Também chamada de ETCC ou tDCS (do inglês “transcranial direct current stimulation”), a estimulação transcraniana por corrente contínua é uma técnica de neuromodulação que utiliza a aplicação de uma corrente elétrica de baixa intensidade no córtex cerebral.

Técnicas de neuromodulação são técnicas usadas para estimular alterações em determinadas regiões do cérebro, a depender do resultado desejado. Essas técnicas são interessantes porque costumam ser não-invasivas (não requerem cirurgia ou invasão dos tecidos) e provocam poucos efeitos colaterais, ao contrário do tratamento convencional com medicação.

Leia mais: Neuromodulação: O que é? Como funciona?

No caso da tDCS, são usadas correntes de baixa intensidade, entre 1 e 3 mA, que agem sobre o córtex cerebral provocando uma série de alterações neuroquímicas que ajudam a restabelecer o fluxo de neurotransmissores, substâncias químicas presentes no cérebro que são responsáveis por repassar informações entre os neurônios.

A técnica é feita ao aplicar eletrodos no couro cabeludo do paciente e permitir o fluxo de uma corrente elétrica por esses eletrodos durante cerca de 30 minutos. A corrente tem início no eletrodo negativo (anodo), que é excitatório e facilita a transmissão de informações entre neurônios, e vai para o eletrodo positivo (catodo), que é inibitório, ou seja, dificulta a transmissão de informações entre neurônios.

A depender do transtorno apresentado e da resposta do paciente, são feitos ajustes na intensidade da corrente elétrica, bem como na duração e frequência das sessões. 

Quais as indicações da ETCC?

A tDCS é uma técnica que vem sendo estudada há bastante tempo e suas indicações são bastante variadas. Neste artigo, iremos focar na tDCS para depressão, mas é interessante saber que a técnica também é usada (geralmente em caráter experimental) nas seguintes condições:

  • Lesões neurológicas;
  • Afasia;
  • Epilepsia;
  • Dores crônicas (fibromialgia e enxaqueca);
  • Reabilitação motora;
  • Esquizofrenia (alucinações auditivas e sintomas negativos);
  • Dependência química;
  • Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC);
  • Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH);
  • Desenvolvimento da fala no transtorno do espectro autista (TEA).

Qual a eficácia da ETCC/tDCS para depressão?

A ETCC parece ser provavelmente eficaz no tratamento da depressão. Estima-se que sua ação esteja relacionada a padrões de funcionamento anormais no cérebro, que são corrigidos pela corrente elétrica contínua de baixa intensidade.

Embora não se saiba exatamente as causas da depressão e como ela se manifesta no cérebro com precisão, estima-se que pessoas que sofrem do transtorno apresentam uma certa hiperatividade no lado direito da região frontal do cérebro, enquanto há hipoatividade no lado esquerdo. Este padrão é diferente da atividade cerebral encontrada em pessoas não diagnosticadas com depressão.

Portanto, a aplicação de uma corrente elétrica excitatória (que facilita a troca de informações entre neurônios) no lado esquerdo pode ajudar a restaurar o equilíbrio do funcionamento cerebral, o que pode diminuir os sintomas depressivos.

Vale ressaltar, no entanto, que não foi comprovado com exatidão que este é o mecanismo de funcionamento da tDCS. Embora pareça ter eficácia na diminuição dos sintomas, não se sabe precisamente se é por conta dessa suposta restauração do equilíbrio.

Também é importante notar que a eficácia da tDCS para depressão é algo muito discutido, pois as pesquisas mostram resultados muitas vezes inconclusivos. Atualmente, a técnica é considerada pela comunidade científica como provavelmente eficaz, ou seja, não se trata de um tratamento comprovadamente eficaz, mas que tem probabilidade de funcionar.

Um estudo realizado por pesquisadores da USP mostram que a ETCC tem uma eficácia menor do que o tratamento medicamentoso com antidepressivo. O estudo foi feito comparando a técnica com o uso de escitalopram, e descobriram que o escitalopram traz resultados mais significativos do que apenas a técnica de neuromodulação.

A pesquisa foi feita com 245 participantes separados em três grupos: o primeiro grupo recebeu o tratamento com tDCS e pílulas placebo (remédio sem o princípio ativo, ou seja, que não fazem efeito), o segundo grupo foi tratado com uma simulação de tDCS (foram simuladas sessões de tratamento, mas o aparelho não foi ligado) e com o medicamento antidepressivo, e o terceiro grupo foi “tratado” com tDCS simulado e pílula placebo (em outras palavras, não recebeu nenhum tipo de tratamento). Tudo isso foi feito sem que os participantes soubessem se estavam recebendo o tratamento ou se era apenas simulação.

A tDCS foi inicialmente aplicada por 15 dias consecutivos, e depois a frequência de aplicação mudou para uma vez por semana durante 7 semanas. As sessões tinham duração de 30 minutos. Já o antidepressivo foi administrado diariamente com doses de 10mg durante as 3 primeiras semanas e depois a dose foi aumentada para 20mg durante 7 semanas.

O que os pesquisadores encontraram com esse estudo é que a eficácia da tDCS não chega nem à metade da eficácia do tratamento com antidepressivo. Em outras palavras, a eficácia da tDCS é menos do que 50% da eficácia da medicação. Contudo, quando comparada com pessoas que não receberam tratamento, a tDCS ainda apresentou certa eficácia, ajudando a melhorar os sintomas depressivos.

Por conta disso, atualmente, a ETCC não é um tratamento de primeira linha, ou seja, não se trata de uma técnica recomendada como uma das primeiras opções para pacientes que estão iniciando o tratamento da depressão. Apesar disso, a técnica ainda pode ser usada como um último recurso nos casos em que a pessoa não responde ao tratamento convencional, sendo inclusive usada em conjunto com as medicações a fim de potencializar o efeito destas.

Conclusão

Embora a estimulação transcraniana por corrente contínua tenha sido anunciada como um tratamento promissor durante alguns anos, parece que a sua eficácia não é tão grande quanto se pensava inicialmente. No momento, existem diversas outras técnicas neuromoduladoras que apresentam eficácia maior, como por exemplo a Estimulação Magnética Transcraniana (EMTr) e a clássica eletroconvulsoterapia (ECT).

Referências

Brunoni, A. R., Moffa, A. H., Sampaio-Junior, B., Borrione, L., Moreno, M. L., Fernandes, R. A., … Benseñor, I. M. (2017). Trial of Electrical Direct-Current Therapy versus Escitalopram for Depression. New England Journal of Medicine, 376(26), 2523–2533. doi:10.1056/nejmoa1612999
https://agencia.fapesp.br/contra-a-depressao-uso-de-medicamentos-e-melhor-que-o-de-corrente-eletrica/25797/
https://kandel.com.br/treinamento-medico/protocolos-terapeuticos-para-tdcs/#depr
https://gntech.med.br/blog/post/depressao-medicamentos-ou-corrente-eletrica

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