Memórias ligadas a derrota social podem dominar o hipocampo

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O estudo de memórias é complexo e ainda estamos muito longe de compreender muitas coisas acerca dessa capacidade cognitiva. Apesar de sabermos, em partes, como as memórias são processadas e armazenadas, ainda há muitas dúvidas acerca deste processo e das memórias em si.

Ainda assim, é possível estudar o impacto de determinadas memórias na saúde mental e na qualidade de vida das pessoas. Indivíduos que sofrem de estresse pós-traumático, por exemplo, possuem uma ligação forte entre memórias traumáticas e sua saúde mental.

O que novas pesquisas mostram é que, de certa forma, as memórias podem ter um grande impacto também em outros transtornos, como a depressão. Isso porque, aparentemente, memórias de derrota social se apropriam do hipocampo, piorando sintomas depressivos.

O que é o hipocampo?

O hipocampo é uma área do cérebro relacionada tanto às emoções quanto às memórias. Ele auxilia no processamento de memórias, especialmente quando há alguma carga emocional envolvida.

É como se o cérebro desse prioridade a lembrar de coisas que também causam emoções e, portanto, designou uma parte de si para cuidar dessas duas coisas.

Tente lembrar do dia mais emocionante da sua vida e, em seguida, lembre de um dia qualquer. Perceba como você pode lembrar do dia emocionante em detalhes, enquanto as memórias de um dia qualquer são vagas — você até lembra de algumas coisas, como o que fez durante o dia, mas não lembra de detalhes.

Isso se dá justamente por conta dessa prioridade em armazenar memórias emocionalmente significativas, o que é importante visto que as emoções são, de fato, um dos nossos recursos para a sobrevivência.

Um exemplo é o medo, que auxilia em situações perigosas, preparando o organismo para lidar com a ameaça. Memórias relacionadas ao medo geram a ansiedade, que ajuda a preparar o organismo para uma ameaça futura. Quando bem equilibradas, nossas emoções trabalham junto com a memória e servem para auxiliar nossa sobrevivência.

Derrota social

Como vimos anteriormente, o cérebro parece ter uma preferência por memórias com um componente emocional significativo e, portanto, são maiores as chances de armazenarmos memórias boas ou ruins. Ainda que existam memórias “neutras”, estas são armazenadas com menos prioridade.

Memórias que envolvem derrota social parecem ser significativas, de acordo com um estudo publicado no periódico científico Journal of Neuroscience, realizada por Zhang e colegas.

“Derrota social” é um termo usado quando um animal perde uma batalha. No caso de seres humanos, não é preciso que seja uma luta física: sair como errado ou perdedor em qualquer situação hostil, como uma discussão, é considerado uma derrota social.

nquanto algumas pessoas conseguem lidar com isso tranquilamente, outras acabam sofrendo muito com essa derrota. Sentimentos de estresse, vergonha e culpa podem surgir como resultado de uma derrota social — eis o componente emocional que pode ajudar o hipocampo a fixar essa memória com mais detalhes.

A pesquisa de Zhang e seus colegas mostra exatamente isso: memórias negativas relacionadas a derrota social podem se fixar melhor em alguns cérebros, numa espécie de rede de neurônios. Essas redes de neurônios se chamam “engramas” e estão associadas a memórias específicas.

Os pesquisadores usaram um modelo chamado “estresse de derrota social crônico” em ratos para analisar a ativação e formação de engramas relacionados a derrota social no cérebro dos animais, levando em conta a suscetibilidade e a resiliência desses animais a esse estressor.

O que eles descobriram é que, em ratos mais suscetíveis ao estressor, foram formados engramas em quantidade superior no hipocampo — como se as memórias negativas estivessem tomando conta dessa área do cérebro. Esses mesmos animais mostraram, também, comportamentos associados à depressão em ratos.

É importante ressaltar que o hipocampo não pode ser definido como o lugar onde as memórias são armazenadas no cérebro. Pesquisas mostram que não existe um único lugar onde as memórias são armazenadas e é justamente essa concentração de memórias negativas no hipocampo que causam curiosidade nos pesquisadores acerca dos motivos e consequências desse armazenamento.

O que isso significa?

Embora o estudo tenha sido realizados em ratos, os pesquisadores acreditam que a presença de uma grande quantidade desses engramas no hipocampo pode ser um dos fatores subjacentes a sintomas depressivos em seres humanos.

Os pesquisadores também perceberam que, ao reprimir esses engramas de memórias negativas, os sintomas de evitação social dos ratos diminuíram. A ativação de engramas positivos também aliviaram os comportamentos relacionados à depressão, o que corrobora com a hipótese de que a existência desses engramas de memórias negativas auxilia no desenvolvimento de sintomas depressivos.

Para os seres humanos, isso pode ser uma boa notícia: embora ainda sejam necessários muitos estudos, esse é um primeiro passo para o desenvolvimento de um novo tipo de tratamento para depressão, focado na inibição dessas memórias negativas presentes no hipocampo.

Há sempre pesquisas a respeito de novos tratamentos para depressão, mas já existem uma quantidade considerável de tratamentos eficazes. Por isso, não deixe de consultar um médico ao sentir os sintomas.

Se você acredita que está sofrendo com sintomas depressivos, mesmo que leves, lembre-se de entrar em contato com um psicólogo ou psiquiatra de confiança.

Referências

Zhang, T. R.; Larosa, A.; Di Raddo, M.; Wong, V.; Wong, A. S. & Wong, T. P. (2019). Negative Memory Engrams in the Hippocampus Enhance the Susceptibility to Chronic Social Defeat Stress. Journal of Neuroscience (First published: August 12, 2019) DOI: 10.1523/JNEUROSCI.1958-18.2019

https://www.psychologytoday.com/intl/blog/the-athletes-way/201908/memories-linked-social-defeat-can-hijack-the-hippocampus

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