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Popularmente conhecida como maconha, a Cannabis sativa é a droga ilícita mais consumida no mundo inteiro. Em alguns países, seu uso recreacional é legalizado, e a droga é vista como “leve”. No entanto, pesquisas recentes mostram que o consumo de maconha pode não ser tão inofensivo assim.
São muitas as substâncias presentes na cannabis. As principais são o THC e o canabidiol (CBD), que têm efeitos bem diferentes entre si. O THC é a substância que dá o “barato”, motivo pelo qual a droga é consumida recreativamente. Já o CBD tem se mostrado promissor no tratamento de diversos transtornos, como a epilepsia e a esclerose múltipla.
De fato, ainda há muito estudo a ser feito a respeito da cannabis, mas o que se sabe hoje em dia já é o bastante para desmistificar algumas coisas e alertar as pessoas sobre os potenciais perigos do consumo desta droga. Entenda:
Efeitos da cannabis no organismo
O uso recreativo da maconha traz diversos efeitos que, inicialmente, são atrativos ao usuário. No entanto, quando há uma intoxicação por cannabis, o indivíduo pode apresentar sintomas psicóticos, como:
- Paranoia;
- Alucinações;
- Pensamentos desorganizados;
- Delírios;
- Alterações na percepção;
- Euforia;
- Ansiedade;
- Prejuízo na atenção e memória.
Isso tudo ocorre em pessoas sem qualquer tipo de transtorno. Já no caso de pessoas que apresentam algum transtorno psicótico, os sintomas são piorados pelo consumo de cannabis.
Relação entre a cannabis e a psicose
Estudos recentes mostram que a cannabis possui alguma relação com o desenvolvimento de transtornos psicóticos, como a esquizofrenia. Isso pode parecer evidente por conta dos sintomas psicóticos que a maconha induz no usuário.
No entanto, não se sabe se esta é uma relação causal: o que estes estudos encontraram é que muitas pessoas com esquizofrenia costumam consumir cannabis e pessoas que consomem cannabis têm maior chance de desenvolver o transtorno.
Se houvesse uma relação causal, ela poderia ser tanto “consumir cannabis leva à esquizofrenia” quanto “esquizofrenia leva ao consumo de cannabis”. Contudo, os estudos também encontraram que pessoas com sintomas psicóticos leves não necessariamente iriam consumir cannabis se elas já não usavam a substância antes de apresentar os sintomas.
Existe, no entanto, alguns fatores de risco para o desenvolvimento de esquizofrenia relacionado ao consumo de cannabis. São eles histórico familiar de esquizofrenia, histórico de abuso infantil (físico, sexual ou emocional) e crescer em um ambiente urbano.
É interessante notar que o histórico de abuso infantil e crescer em ambiente urbano está relacionado tanto ao desenvolvimento de esquizofrenia quanto ao consumo de cannabis separadamente. Sendo assim, esses fatores podem auxiliar na busca de uma explicação da relação entre esquizofrenia e consumo de cannabis.
Consequências do uso prolongado
Apesar de muitos dizerem que a cannabis não causa sequelas a longo prazo, estudos recentes mostram o contrário. Os sintomas psicóticos causados pela maconha podem durar mais tempo do que o esperado, de acordo com um estudo publicado de 2017 no The American Journal on Addictions.
O estudo realizou uma avaliação psiquiátrica e psicométrica em 48 pessoas que faziam o uso intenso de cannabis, dos quais 16 estavam presos e não tinham mais acesso à substância. Foram analisados os sintomas apresentados e os hábitos de consumo dos usuários.
Analisando os níveis de canabinóides presentes nos fios de cabelo dos usuários, os pesquisadores perceberam que, mesmo nos usuários presos e sem acesso à cannabis, os sintomas psicóticos como alucinações, delírios e outros prejuízos cerebrais eram condizentes com a quantidade de canabinóides encontrada nos cabelos.
Neste estudo, ficou claro que um dos maiores prejuízos causados pelo abuso da maconha é na memória. Todos os participantes do estudo demonstraram problemas de memória, mesmo após uma reavaliação 3 meses depois.
THC versus CBD
Como dito anteriormente, o THC e o CBD são as substâncias ativas mais conhecidas presentes na maconha. Pesquisas mostram que as duas têm efeitos diferentes, até mesmo contraditórios.
Enquanto o THC proporciona sintomas psicóticos, o CBD faz o contrário. Estudos mostram que o canabidiol é capaz de amenizar tais sintomas em pessoas com transtornos psicóticos, mas que não fazem o uso recreativo da cannabis.
O problema é quando o indivíduo faz o uso recreativo da maconha, uma vez que, em modelos animais, o CBD inibe a metabolização do THC. Sendo assim, o THC não sai do organismo e, quando passa o efeito do CBD, todo o THC acumulado entra em ação, piorando os sintomas psicóticos.
Atualmente, estão sendo feitas pesquisas para utilizar o CBD como um antipsicótico, pois ele apresenta resultados promissores em comparação com os outros antipsicóticos presentes no mercado. No entanto, para que isso se torne realidade, são necessários mais estudos. Para que haja os resultados esperados, no entanto, a substância deve ser isolada do THC e o paciente não deve fazer o uso recreativo de maconha.
Maconha na adolescência
O consumo exagerado de cannabis é prejudicial em qualquer idade, mas parece ter um efeito mais relevante quando o consumo se inicia na adolescência.
Pesquisas mostram que há um declínio no coeficiente de inteligência (QI) em usuários de cannabis. O QI não se recupera mesmo após ter interrompido o consumo por 1 ano, especialmente no caso de adolescentes. Além disso, resultados negativos em testes neuropsicológicos continuam estáveis mesmo após 10 meses de abstinência da droga em adolescentes.
Uma explicação para isso pode ser porque diversas redes neurais importantes para a cognição estão em maturação durante a adolescência, e o uso da droga altera a atividade nessas regiões, causando prejuízos maiores em adolescentes quando comparado a adultos que já estão com essas redes neurais maduras.
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Apesar da grande quantidade de pesquisas a respeito da cannabis, ainda existem muitos que insistem em dizer que seu uso é inofensivo. Por isso, da próxima vez que você ver alguém falando sobre isso, que tal compartilhar um pouco de conhecimento? E não esqueça de, se precisar, entrar em contato com seu médico de confiança.
Referências
Manseau, M., & Goff, D. (2015). Cannabinoids and Schizophrenia: Risks and Therapeutic Potential. Neurotherapeutics, 12(4), 816-824. doi: 10.1007/s13311-015-0382-6
Nestoros, J. et al (2017). Long lasting effects of chronic heavy cannabis abuse. The American Journal On Addictions, 26(4), 335-342. doi: 10.1111/ajad.12529
Camchong, J., Lim, K., & Kumra, S. (2016). Adverse Effects of Cannabis on Adolescent Brain Development: A Longitudinal Study. Cerebral Cortex, 1-9. doi: 10.1093/cercor/bhw01