Pessoas com depressão buscam evitar situações competitivas

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A depressão é um transtorno capaz de trazer prejuízos e todas as áreas da vida, inclusive sociais. O paciente com depressão pode ter dificuldade em manter suas relações interpessoais, assim como dificuldades em lidar com situações no trabalho ou na vida acadêmica. Por conta disso, há vários estudos que buscam compreender essa natureza “autossabotadora” da depressão.

Um desses estudos, publicado em 2016 no periódico científico BJPsych Open, mostra que pessoas com depressão tendem a evitar situações competitivas, o que pode ajudar a explicar alguns desses prejuízos sofridos.

Hipótese da competição social

O estudo leva em consideração uma hipótese que vê o estado depressivo como uma espécie de estratégia não consciente e involuntária na qual o indivíduo aceita as derrotas mais facilmente diante de situações competitivas.

Pode parecer estranho, mas existe uma explicação lógica por trás desse comportamento: adaptação evolutiva. A teoria de Darwin fala a respeito da sobrevivência dos mais aptos e, por isso, aqueles melhores adaptados são os que conseguem seguir em frente. Nessa perspectiva, a depressão teria, até mesmo, um papel evolutivo.

A hipótese da competição social diz que, ao se deparar com uma situação competitiva na qual as chances de ganhar são pequenas, a pessoa com depressão tende evitar comportamentos agressivos e competitivos, dando preferência a comportamentos submissivos e de afiliação. Com isso, mesmo eliminando as chances de sair na vantagem, a pessoa reduz significativamente os prejuízos de uma possível derrota.

Para ilustrar, pensemos em uma situação na qual duas pessoas descobrem uma fonte de alimentos. É provável que, numa situação dessas, as duas pessoas entrem em uma competição para afirmar que aquela fonte seria sua propriedade. É o famoso “eu vi primeiro, então é meu!”. A pessoa com depressão, entretanto, evita essa competição demonstrando sinais de afiliação e/ou submissão. Dessa forma, mesmo que ela não tenha a fonte inteira de alimentos para si, é bem provável que a outra pessoa, “dona” da fonte, divida os alimentos com ela.

Essa hipótese se mostra bastante provável, visto que há evidências de que o comportamento submissivo associado à depressão é diminuido com o uso de antidepressivos. Além disso, existe um padrão no qual, em algumas pessoas, crises depressivas surgem em momentos de competição e são resolvidas após reconciliação.

O estudo

O objetivo desse estudo era verificar se, comparado a pessoas mentalmente saudáveis, pacientes com depressão iriam evitar a competição dentro do mesmo contexto.

Foi realizado, portanto, um experimento econômico no qual duas pessoas tinham que realizar uma tarefa e, antes de iniciar, elas deveriam escolher um esquema de pagamento, entre competitivo e cooperativo.

A terefa consistia em dobrar folhas de papel e colocá-las em um envelope. Para cada envelope fechado, a pessoa recebia uma unidade monetária (como se fosse R$ 1).

No esquema de pagamento competitivo, a performance das duas pessoas eram comparadas e o que tivesse melhor performance recebia todas as unidades monetárias conquistadas, as unidades monetárias conquistadas pelo adversário e um bônus de 50%. Já no esquema cooperativo, os dois participantes recebiam a média das unidades monetárias conquistadas por cada.

Cada participante realizou o experimento duas vezes: uma vez contra uma pessoa saudável ou com diagnóstico desconhecido e uma vez contra uma pessoa com o mesmo diagnóstico.

A amostra foi composta por 3 grupos de mulheres: 1 grupo com o diagnóstico de depressão maior, 1 grupo com diagnóstico de transtorno de personalidade borderline (TPB) e 1 grupo controle sem diagnóstico de transtorno mental.

Antes de realizar a tarefa, as participantes tinham que escolher o esquema de pagamento e, antes de fazer essa escolha, elas eram informadas sobre o status clínico da oponente: se ela tinha um diagnóstico desconhecido (diferente do próprio diagnóstico da participante), se ela não tinha nenhum diagnóstico ou se ambas tinham o mesmo diagnóstico.

Resultados

Quando colocadas junto de oponentes com diagnóstico desconhecido ou sem diagnóstico, apenas 13% das participantes com transtorno depressivo maior escolheram o esquema de pagamento competitivo. Já dentre as participantes do grupo controle sem diagnóstico, mais da metade (53%) escolheu competir.

No grupo de pacientes com transtorno de personalidade borderline, 41% das participantes escolheram o esquema competitivo. Isso é interessante porque o TPB geralmente causa sintomas depressivos tão graves quanto a depressão maior e, ainda assim, o número de participantes escolhendo competir foi significativamente maior do que no grupo de pacientes com depressão. Isso pode indicar que não são apenas os sintomas depressivos que levam à evitação da competição.

As participantes com depressão que escolheram o esquema cooperativo demonstraram mais sintomas depressivos e ansiosos do que as participantes que escolheram o esquema competitivo.

Contudo, quando confrontadas com pacientes com o mesmo diagnóstico, 70% das participantes com depressão maior escolheram competir. Isso indica que, talvez, a crença da pessoa com depressão a respeito das outras pessoas tenha alguma influência na escolha pela competição ou cooperação.

Os resultados da pesquisa são congruentes com a hipótese de que, na depressão, evitar a competição é uma estratégia involuntária para minimizar as perdas, possivelmente baseada nas crenças irreais que a pessoa tem acerca de si mesma, das suas capacidades e das capacidades de outras pessoas.

Se você está passando por um momento ruim e sente que está sofrendo com sintomas depressivos, não esqueça de entrar em contato com um psicólogo ou psiquiatra de confiança. A depressão tem tratamento e é possível ter uma boa qualidade de vida!

Referências

Kupferberg, A., Hager, O. M., Fischbacher, U., Brändle, L. S., Haynes, M., & Hasler, G. (2016). Testing the social competition hypothesis of depression using a simple economic game. BJPsych Open, 2(02), 163–169. doi:10.1192/bjpo.bp.115.001362

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