Slow medicine: o que é, como funciona na psiquiatria?

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Para a maioria das pessoas, ir ao médico e sair com uma receita de medicamento ou indicação de exames já virou o esperado. Afinal de contas, ninguém vai ao médico para sair de mãos vazias, não é mesmo?

A verdade é que, na maior parte das vezes, os pacientes não param para questionar se esse é o tratamento mais adequado. Confiam plenamente nos médicos e não têm noção dos possíveis efeitos colaterais dos tratamentos receitados. Contudo, esse não é o quadro ideal.

É fato que os médicos estudam anos para aprender a lidar com as enfermidades do corpo humano, mas existe um problema sério quando não há diálogo no consultório. Quando o paciente não tem voz, o médico pode acabar receitando medicamentos não adequados para aquela pessoa, bem como errar nos exames por não ter todas as informações necessárias para fazer um diagnóstico correto.

Essa falta de diálogo não surge apenas da posição de autoridade do médico, mas também porque muitas vezes a rotina do profissional se torna automatizada, especialmente quando há a cobrança de que as consultas sejam rápidas e que os pacientes saiam do consultório com indicações – muitas vezes desnecessárias.

Existe, no entanto, uma crescente quantidade de médicos adotando a chamada slow medicine, uma prática que valoriza esse diálogo entre paciente e profissional de saúde, humanizando as relações e o atendimento. Em contrapartida, a medicina feita de maneira rápida e descuidada como vimos atualmente é chamada por alguns de “medicina rápida”.

O que é slow medicine?

A slow medicine, traduzida como “medicina sem pressa”, é uma prática médica que valoriza a relação entre médico e paciente, evitando sessões rápidas e automatizadas que terminam em indicações desnecessárias. Trata-se de uma medicina mais nivelada, na qual tanto paciente quanto médico têm voz no consultório.

O que muitos não sabem é que, por lei, o paciente tem o direito de rejeitar o método terapêutico receitado. Porém, grande parte dos pacientes não faz isso por não entender as consequências do tratamento. Isso se dá por conta dessa pressa na medicina que faz com que as consultas sejam pobres em qualidade, porém ricas em indicações e prescrições.

Um médico adepto ao slow medicine, ao invés de simplesmente receitar um medicamento, deve explicar ao paciente as vantagens e desvantagens deste tratamento, as implicações do diagnóstico bem como apresentar alternativas quando possível.

Existem muitos casos, por exemplo, em que um tratamento adequado é uma alimentação mais saudável, mas muitos médicos acabam apenas prescrevendo antiácidos para os pacientes, sem explicar para quê servem os medicamentos, os possíveis efeitos colaterais, as alternativas mais saudáveis, entre outros. E, por conta da autoridade do médico, os pacientes costumam aceitar essa abordagem, sem se questionar se isso realmente fará bem para eles a longo prazo.

A slow medicine surge para combater tudo isso, tendo como seus pilares o tempo para ouvir as queixas do paciente; a autonomia do paciente para escolher, dentre os possíveis tratamentos, aquele que julga ser o melhor para si; a individualização dos casos (pacientes com sintomas parecidos não necessariamente devem ser tratados da mesma maneira); o autocuidado e a qualidade de vida.

Como consequência, há uma diminuição na quantidade de exames e medicamentos receitados. Inicialmente, isso pode parecer estranho para o paciente, mas no fim das contas pode ser algo bem positivo, tendo em que vista que menos exames e medicamentos significa um peso menor no bolso e uma chance menor de ter problemas com os efeitos colaterais a longo prazo.

Slow medicine na psiquiatria

A psiquiatria é vista como a “parte médica” da saúde mental, responsável apenas por diagnosticar transtornos mentais e indicar um tratamento farmacológico, enquanto a terapia seria responsabilidade de outros profissionais, como os psicólogos. Há muitos que pensam, inclusive, que a psiquiatra é uma “testadora de remédios”, que prescreve vários medicamentos até ver qual deles vai funcionar melhor.

Embora exista um motivo para que a psiquiatria seja vista desse jeito, isso não necessariamente precisa ser verdade. Enquanto alguns psiquiatras podem ter uma prática médica mais parecida com a medicina rápida, os que praticam a medicina sem pressa têm um papel que vai além do de um mero “prescritor de remédios”. 

Práticas como.a psicoeducação (explicar para o paciente e familiares como funciona a mente e os transtornos mentais), a necessidade de uso (ou não) das medicações, que efeitos e efeitos colaterais esperar delas, qual o tempo mínimo de tratamento e até mesmo quais psicoterapias são mais indicadas para cada caso só podem ser realizadas com o tempo que o adepto da slow medicine pode fornecer.

Muitos medicamentos psiquiátricos agem em diversas frentes. Um só antidepressivo pode modificar padrões de sono, humor, apetite, libido, entre outros. Dessa forma, se uma pessoa com depressão usa um medicamento desses e tem uma melhora no humor, mas outras partes de sua vida são afetadas negativamente pelo medicamento, então esse pode não ser o tratamento adequado para o caso.

Além disso, em uma “psiquiatria sem pressa”, os diagnósticos poderiam ser dados com mais precisão. Uma pessoa com sintomas depressivos não necessariamente sofre de depressão e precisa de um medicamento ou de um tratamento focado nos sintomas, mas sim melhorar suas relações interpessoais, por exemplo. Isso porque os sintomas podem estar surgindo dessas relações, e não de um transtorno mental.

Todo diagnóstico e tratamento é discutido em relação ao contexto no qual a pessoa se encontra, ao invés de levar em consideração somente os sintomas.

Por isso, a instituição de uma psiquiatria sem pressa indica uma psiquiatria na qual o papel dos medicamentos é diferente: não se trata de remediar uma doença, mas sim ajudar o paciente a lidar com as causas do seu problema. Neste contexto, medicamentos fazem parte de um processo mutável, não sendo necessários durante toda a vida, como muitos pensam que são.

A maneira como a medicina lida com os pacientes atualmente pode acabar trazendo prejuízos. Muitos médicos estão em busca de uma forma de atendimento mais humanizada, considerando o ser humano que é atendido, levando em conta suas necessidades, preferências e contexto.

A psiquiatria, por sua vez, também pode se beneficiar deste modelo, tendo em vista que muitas pessoas podem receber diagnósticos e prescrições desnecessariamente.

Se você está passando por algum problema e acha que precisa de ajuda de um profissional da saúde mental, não se esqueça de conversar com um psiquiatra ou psicólogo de confiança.

No Instituto de Psiquiatria do Paraná procuramos atender as boas práticas médicas e psicológicas baseadas em evidências científicas e de slow medicine.

Referências

https://infograficos.estadao.com.br/focas/tanto-remedio-para-que/comportamento-1.php

https://www.conexaosegurosunimed.com.br/slow-medicine-como-funciona-o-atendimento-sem-pressa/

https://g1.globo.com/bemestar/blog/longevidade-modo-de-usar/post/2018/10/21/slow-medicine-quer-resgatar-o-tempo-dedicado-ao-paciente.ghtml

https://www.mentalhealthexcellence.org/slow-psychiatry-integrating-need-adapted-approaches-with-drug-centered-pharmacology/

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