O que é Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT)?
A terapia de aceitação e compromisso, frequentemente chamada de ACT, é uma terapia cognitivo-comportamental de terceira onda que tem por objetivo aumentar a flexibilidade psicológica. Essa terapia é baseada em estratégias de aceitação, mindfulness e comprometimento a fim de obter uma mudança no comportamento.
A ACT acredita que o sofrimento humano surge a partir de uma inflexibilidade psicológica causada por esquiva experiencial, fusão cognitiva, apego a um conceito rígido de si mesmo e a perda do contato com o momento presente. Tudo isso leva o indivíduo a ter dificuldade em agir de acordo com seus próprios valores, frequentemente tomando decisões que considera erradas e acumulando dificuldades em sua vida.
Já a flexibilidade psicológica implica em um contato direto e completamente consciente com o momento presente, sem se deixar levar por pensamentos automáticos e emoções, agindo de acordo com os seus próprios valores.
Há um foco relativamente alto na linguagem nessa abordagem terapêutica. Isso porque a maneira que a linguagem afeta a nossa percepção também pode contribuir para essas distorções cognitivas. Por isso, técnicas relacionadas a reformulação de falas e pensamentos são constantemente usadas nessa terapia.
A terapia de aceitação e compromisso recebe esse nome porque é focada em 3 áreas:
- Aceitação da realidade e das reações emocionais e comportamentais;
- Escolha de uma direção de acordo com os valores do indivíduo;
- Comprometimento com a mudança desejada.
Fatores que levam ao sofrimento de acordo com a ACT
Fusão cognitiva
A fusão cognitiva pode ser definida como um estado no qual a pessoa está fundida com seus pensamentos e sentimentos. A pessoa passa a interpretar o que sente e pensa como o que está acontecendo de fato, ao invés de se atentar à realidade. É como se a pessoa vivesse no que está se passando em sua cabeça e não no mundo real.
Embora seja um fenômeno natural da nossa psique, a fusão cognitiva pode ser bastante prejudicial quando há distorções cognitivas. Essas distorções fazem com que os pensamentos e sentimentos do indivíduo não sejam muito precisos em relação à realidade, resultando em interpretações errôneas acerca dos acontecimentos. Portanto, “viver” nossos pensamentos e sentimentos às vezes pode atrapalhar mais do que ajudar.
Esquiva experiencial
Também chamada de evitação experiencial, a esquiva experiencial é a tendência que as pessoas têm de evitar situações que acreditam que podem lhe causar desconforto psicológico.
Esse desconforto psicológico aparece na forma de pensamentos negativos e autodepreciativos. Por exemplo, uma pessoa pode deixar de ir na academia, uma atividade importante e frequentemente positiva, por achar que será julgada pelo seu jeito de fazer exercícios ou pelo seu condicionamento físico no momento. A fim de evitar esses pensamentos, a pessoa não vai na academia e deixa de fazer exercícios.
Conceito rígido de si mesmo
As pessoas tendem a ver umas às outras como estáveis, constantes ou até mesmo rígidas. Usam adjetivos para descrever a si mesmas como se fossem apenas aquilo em todos os momentos da vida. São usados rótulos como “agradável” ou “fracassado” para definir uma pessoa, e isso pode ter um peso bem grande na saúde mental.
Falta ou confusão em relação aos valores
Valores são como uma bússola interna que dão sentido e direção à nossa vida. Eles ajudam na hora de tomar decisões e agir perante as situações. Esses valores estão diretamente relacionados com aquilo que valorizamos na vida. Por exemplo, se uma pessoa valoriza a natureza, ela tentará levar uma vida com o mínimo impacto ambiental possível.
Podemos ter valores em diversos aspectos da nossa vida. Valores acerca de relacionamentos, da nossa vida social, do trabalho, saúde, entre outros. Contudo, quando uma pessoa entra em um estado de fusão cognitiva frequente, é fácil acabar se esquecendo de seus valores e tomar decisões incompatíveis com aquilo que acredita.
Alguns conceitos da terapia de aceitação e compromisso
A seguir são apresentados alguns conceitos que guiam os trabalhos na ACT. Nem todos tem um fim em si, mas interagem entre si para conseguir alcançar o objetivo geral da terapia, que é a flexibilidade psicológica.
Aceitação
Muitas coisas que acontecem conosco são desagradáveis e, por isso, não queremos aceitá-las. Contudo, isso pode acabar piorando ainda mais a situação. É o caso da pessoa em uma crise de ansiedade que, sem aceitar a ansiedade, acaba ficando ainda mais ansiosa.
A aceitação consiste em um envolvimento consciente nesses eventos desagradáveis. No caso da pessoa em crise de ansiedade, é melhor sentir a ansiedade de uma vez do que tentar se defender e falhar, gerando mais ansiedade ainda.
O mesmo vale para qualquer sentimento negativo: lutar contra eles muitas vezes não melhora a situação. Pelo contrário, pode até piorar. Aceitar o que está sentindo e se deixar sentir é a chave para que o sentimento seja resolvido.
Defusão cognitiva
A defusão cognitiva nada mais é do que o processo contrário à fusão cognitiva. Busca-se mudar a maneira que se interage com os pensamentos, sentimentos e percepções, não mais vivenciando eles como realidade, mas como simples percepções que podem estar erradas.
Ao ter um pensamento negativo, por exemplo, a pessoa pode aceitá-lo como uma realidade ou perceber que se trata apenas de um pensamento e não um fato consumado. Para isso, há uma variedade de técnicas que o terapeuta pode ensinar ao paciente durante o curso da terapia.
Uma das técnicas envolve narrar o processo do pensamento. Ao invés de aceitar o pensamento “eu sou um fracassado” como uma verdade, narrar o processo como “estou pensando que sou um fracassado” ajuda a perceber que se trata apenas de um pensamento, que pode estar errado, e não uma representação fiel da realidade.
Contato com o presente
O contato com o momento presente é de extrema importância para lidar com certos problemas. Por isso, ele também é um dos pilares da ACT.
Ao estar em contato com o presente, a pessoa é capaz de pensar com clareza a respeito das coisas que acontecem, identificando seus pensamentos e interpretações como eventos psicológicos subjetivos e não como parte da realidade.
Além disso, é no contato com o presente que é possível a mudança de comportamento para que suas ações sejam mais consistentes com seus valores.
Eu como contexto
Como dito anteriormente, frequentemente existe um apego a um conceito rígido de si mesmo quando, na realidade, seres humanos são sempre diferentes em diversos contextos.
Ninguém age da mesma forma o tempo inteiro. Nossas emoções afetam nosso comportamento, os eventos externos afetam nosso comportamento… Por mais que tenhamos valores que tentamos seguir, não vamos agir sempre do mesmo jeito.
Tudo depende de um contexto — até mesmo o “eu”, a maneira que usamos para nos definir, depende do contexto. Quem eu sou depende do que aconteceu e do que está acontecendo comigo. É importante ter essa noção porque a concepção de um eu cristalizado pode causar muito sofrimento, especialmente no que tange nossos erros e defeitos.
Admitir que por vezes agimos com agressividade não quer dizer que somos pessoas agressivas 100% do tempo. Contudo, as pessoas que estiveram presente no momento podem achar que sim, e isso pesa na consciência. Ainda assim, a realidade é outra: agimos com agressividade, mas não somos pessoas agressivas. Somos apenas pessoas agindo de acordo com o contexto e não tem nada de errado nisso.
Entender que nossas ações e até mesmo identidade depende de um contexto torna a aceitação da realidade muito mais fácil.
Compromisso
Por fim, um dos conceitos mais importantes é a disposição ao compromisso. Apenas quando o indivíduo se compromete com a terapia e com a mudança de comportamento para comportamentos mais adequados é que a terapia poderá ter algum efeito.
O paciente se compromete com as mudanças desejadas a partir da aceitação e dos valores já trabalhados em terapia.
Qual a indicação da ACT?
A eficácia da ACT já foi comprovada em um grande número de transtornos mentais. Dentre eles, o abuso de substâncias, o transtorno obsessivo-compulsivo, transtornos psicóticos, depressão, transtornos de ansiedade, dores crônicas, entre outros.
Entretanto, não é preciso um diagnóstico para se beneficiar da ACT. Pessoas que estão passando por qualquer tipo de problema emocional podem ter bons resultados com a terapia.
Quanto tempo dura a ACT?
A terapia de aceitação e compromisso é uma terapia breve e, portanto, terapeuta e paciente costumam estabelecer um número de sessões já no início do tratamento. O número e a duração das sessões pode variar conforme a necessidade.
A ACT pode ser tão curta quanto 4 sessões, chegando até 40 sessões ou mais em casos mais graves. Tudo vai depender do diagnóstico do paciente (se ele tiver um diagnóstico, o que não é necessário para fazer a terapia) e do seu comprometimento com a terapia.
Como funciona a sessão?
Na primeira sessão da terapia de aceitação e compromisso, o terapeuta irá pedir a história de vida do paciente, bem como a queixa principal. Isso o ajudará a entender o caso.
Depois, o terapeuta deverá ensinar os princípios da terapia de aceitação e compromisso para que o paciente entenda o que está sendo trabalhado durante a terapia.
A partir das outras sessões, o terapeuta ensina técnicas de aceitação e mindfulness ao paciente e ajuda a identificar e trabalhar com seus valores a fim de promover a mudança desejada no comportamento.
O terapeuta pode passar algumas tarefas ou “lições de casa”, como anotar seus pensamentos e emoções para ajudar no processo de defusão cognitiva, ou praticar mindfulness em vários momentos do dia. Tudo vai depender da queixa trabalhada.
O paciente pode ter alta de terapia quando for constatado que ele conseguiu atingir a flexibilidade psicológica, quebrando os padrões de pensamento e comportamento que impediam a mudança anteriormente.
Embora a terapia vise ensinar o paciente para que ele não precise ficar indo na terapia por muito tempo, ele é sempre bem vindo novamente caso esteja passando por algum momento difícil ou esteja lidando com uma recaída muito séria de um transtorno mental.
A psicologia tem muitas abordagens e todas elas tem o seu valor, mas algumas pessoas se adaptam melhor a umas do que a outras. A ACT é mais uma abordagem bastante eficaz que pode ajudar muitas pessoas.
Se você acha que a terapia de aceitação e compromisso poderia te ajudar com algum problema, não hesite em conversar com um psicólogo ou psiquiatra de sua confiança!
Referências
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-55452008000100008