Distração acentuada e agitação são coisas esperadas de crianças, dependendo da situação. As crianças são curiosas e costumam sempre correr atrás de coisas novas, tendo dificuldade em se prender a uma coisa só. Até certo ponto, isso é normal. Mas e quando esses comportamentos começam a atrapalhar sua vida, especialmente na escola?
Nesses casos, estamos falando do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), um transtorno mental no qual o indivíduo tem dificuldade em manter a atenção concentrada em um estímulo específico. Ela pode vir acompanhada de hiperatividade, ou seja, a incapacidade de manter-se parado diante de uma atividade, sendo necessário fazer outras coisas simultaneamente.
O diagnóstico costuma ser feito durante a infância, mas trata-se de uma condição crônica que pode durar até a vida adulta. É mais comum em meninos, mas suspeita-se que meninas não sejam diagnosticadas com tanta frequência por não apresentarem tantos sintomas que causam prejuízo na escola, ou seja, condutas inadequadas, como não conseguir ficar sentada parada na carteira ou precisar conversar constantemente com algum colega.
Causas
As causas do TDAH são desconhecidas, mas muitos estudos revelam fatores importantes para o desenvolvimento do transtorno. Dentre eles:
- Fatores genéticos: A presença de certos genes aumentam a probabilidade de uma pessoa desenvolver o TDAH. Acredita-se que os genes responsáveis pelo sistema dopaminérgico estejam envolvidos, uma vez que os fármacos que agem nesse sistema ajudam a melhorar os sintomas do transtorno;
- Fatores ambientais: Um ambiente não favorável ao desenvolvimento da criança contribui para o aparecimento do TDAH. Alguns exemplos de dificuldades encontradas na vida social de crianças com o transtorno são os desentendimentos familiares, presença de transtornos mentais nos pais, condições socioeconômicas desfavoráveis, entre outras.
- Gestação: A gestação da criança também pode influenciar no desenvolvimento do transtorno após o nascimento. Estudos mostram que exposição a fumo e álcool durante a gravidez estão relacionadas com o transtorno, além de complicações no parto — no entanto, não há consenso quanto a isso.
Sintomas
O TDAH é um transtorno bastante heterogêneo em suas manifestações. Sendo assim, os sintomas podem variar bastante de acordo com a pessoa e com a fase da vida na qual se encontra.
Os 3 sintomas principais do TDAH são a desatenção, hiperatividade e impulsividade. Alguns exemplos da manifestação destes sintomas são:
Desatenção
- Deixar de prestar atenção em detalhes, cometendo erros pequenos em atividades escolares e trabalhos, por exemplo;
- Dificuldade para manter-se concentrado em atividades lúdicas;
- O indivíduo aparenta não escutar quando lhe dirigem a palavra;
- Frequentemente tem dificuldades para seguir instruções corretamente ou terminar seus deveres (escolares, domésticos ou profissionais);
- Dificuldade para planejar e organizar tarefas e atividades;
- Hesitação frequente para se envolver em tarefas e atividades que requerem grande esforço mental, como deveres escolares;
- Perde ou esquece de trazer os materiais necessários para a realização de uma atividade;
- Distrai-se facilmente com estímulos não relacionados à tarefa que está executando no momento;
- Apresenta esquecimento frequente em atividades diárias.
Hiperatividade
- Agitação das mãos, pés ou necessidade de se mexer constantemente quando sentado em uma cadeira;
- Frequentemente levantar-se da cadeira em situações em que deveria permanecer sentado, como numa sala de aula ou num escritório;
- Crianças podem correr ou tentar escalar objetos com frequência em situações inadequadas. Em adultos e adolescentes, esse sintoma pode ser manifestado como uma inquietação;
- Costuma agir como se estivesse “a todo vapor”;
- Fala em demasia.
Impulsividade
- Costuma dar respostas precipitadas antes mesmo que a pessoa termine de fazer a pergunta;
- Dificuldades para aguardar a sua vez;
- Com frequência interrompe e se intromete em conversas ou brincadeiras de outras pessoas.
Curso do transtorno
A medida em que a pessoa se desenvolve, os sintomas podem mudar. Na adolescência, por exemplo, é comum que os sintomas de hiperatividade estejam ausentes, sendo mais proeminentes os sintomas de desatenção e impulsividade.
Isso não quer dizer que o transtorno entra em remissão, no entanto. Apesar de muito se falar sobre o TDAH em crianças, adultos também sofrem com o transtorno, mas seus sintomas são diferentes.
TDAH em adultos
É raro falar sobre o transtorno em adultos porque o diagnóstico, na maioria das vezes, se dá na infância, principalmente quando a criança apresenta problemas na escola, como comportamentos inadequados e rendimento escolar baixo.
Ainda assim, adultos podem sofrer com o transtorno e ter suas vidas significativamente prejudicadas, mas é difícil se suspeitar de TDAH justamente por ser um transtorno visto como “infantil”. Portanto, não é raro que o adulto com TDAH sofra um certo preconceito, sendo frequentemente culpado pela própria desatenção, que foge de seu controle.
Caso a desatenção prejudique a vida do indivíduo adulto, é necessário que ele consulte um psiquiatra. Os critérios diagnósticos para adultos podem ser um pouco diferentes, uma vez que é comum a remissão de alguns sintomas (mas não todos) ao longo do desenvolvimento da pessoa.
Também é comum que adultos com TDAH tenham aprendido “na marra” a lidar com certos sintomas e, por isso, eles podem não ser tão aparentes. Adultos que mantém agendas muito bem organizadas, por exemplo, podem estar fazendo isso não porque são pessoas planejadoras de fato, mas porque sem essa estratégia, teriam muitos problemas para lidar com as atividades no dia a dia.
De qualquer forma, o diagnóstico do TDAH é possível em adultos, mas é preciso ter em mente que as manifestações do transtorno são diferentes e, por isso, o diagnóstico pode não ser tão fácil assim.
Diagnóstico
Em crianças, é comum que o diagnóstico seja feito por pediatras. Já nos adultos, o profissional capaz de diagnosticar o TDAH é o psiquiatra.
Vale lembrar que é normal que crianças até 5 anos de idade apresentem sintomas de hiperatividade, uma vez que o desenvolvimento cerebral até essa idade propicia esse tipo de conduta.
Por isso, alguns critérios são necessários para o diagnóstico do TDAH. São eles:
- Duração dos sintomas: Os sintomas devem estar presentes durante 6 meses ininterruptos para que haja o diagnóstico de TDAH;
- Frequência e intensidade dos sintomas: Os sintomas devem ser tão frequentes e intensos que causam prejuízos no dia a dia do indivíduo;
- Persistência dos sintomas em diversos locais: É necessário que os sintomas ocorram em diversos locais de convivência da criança. Se os sintomas se manifestam apenas na escola, pode não ser TDAH, mas um transtorno de aprendizagem, por exemplo;
- Prejuízo significativo nas diversas esferas da vida: Caso não haja prejuízos visíveis na vida da pessoa, os sintomas de hiperatividade ou impulsividade podem estar mais relacionados ao temperamento do indivíduo do que a um transtorno de fato;
- Interpretação correta dos sintomas: Alguns sintomas podem ser comuns a outros transtornos. Por isso, é necessário analisar o contexto no qual os sintomas ocorrem. Caso uma criança não siga as ordens de um professor, por exemplo, é preciso buscar entender se isso se dá porque a criança não consegue prestar atenção nas explicações do professor (déficit de atenção) ou se é por querer contrariar a autoridade (característica de outro transtorno, o transtorno opositor desafiante).
Tipos de TDAH
Por ser um transtorno que se manifesta de diversas maneiras, o TDAH pode ser dividido em 3 tipos:
- TDAH predominantemente desatento: Neste tipo, os sintomas de desatenção são mais frequentes. Seu diagnóstico pode ser dificultado pois, durante a infância, a escola pode não perceber se tratar de um transtorno de atenção. Ainda que o indivíduo tenha prejuízos acadêmicos, a falta de comportamentos hiperativos pode levar os professores e demais profissionais da educação a pensar que se trata de um transtorno de aprendizado;
- TDAH predominantemente hiperativo/impulsivo: Os sintomas mais aparentes neste tipo são os de hiperatividade e impulsividade. Pessoas com esse tipo de TDAH podem apresentar comportamentos agressivos, o que pode resultar em rejeição dos colegas e professores, trazendo prejuízos sociais;
- TDAH combinado: Neste tipo, estão presentes em igual intensidade os sintomas desatentos e hiperativos/impulsivos. Assim, o indivíduo sofre um prejuízo global, com dificuldades sociais e acadêmicas.
Comorbidades
Não raramente, pacientes apresentam outros transtornos que acabam por piorar os sintomas do TDAH. Alguns exemplos são:
- Transtorno de conduta;
- Transtorno opositor desafiante;
- Depressão;
- Transtornos de ansiedade;
- Transtornos de aprendizagem.
Tratamento
O tratamento do TDAH envolve intervenções psicossociais e farmacológicas.
Os fármacos utilizados para o tratamento de TDAH são estimulantes, como o metilfenidato (Ritalina). Em certos casos, algumas pessoas não respondem ao tratamento com estimulantes e é necessária a utilização de outros fármacos para tratar o transtorno. É comum a prescrição de antidepressivos tricíclicos, que costumam ser eficazes nesses pacientes. Além disso, tratamento farmacológico com estimulantes deve ser feito com cuidado, pois há casos em que indivíduos desenvolvem dependência do medicamento.
Quando apropriado, a criança deve começar uma terapia cognitivo-comportamental, a fim de desenvolver estratégias comportamentais para manejar os sintomas. É recomendado que os pais também se eduquem a respeito do transtorno e dessas estratégias, para auxiliar a criança com seus sintomas em casa.
A escola é um ambiente onde há muitos estímulos o tempo inteiro, sendo um dos locais onde há muitos desafios para a criança com TDAH. De preferência, a criança deve estar em uma sala com poucas pessoas, mas isso nem sempre é possível. De qualquer forma, é importante que a criança esteja próxima ao professor e longe de janelas e outras fontes de distração.
O fenômeno do hiperfoco
Em atividades prazerosas, os indivíduos com TDAH podem conseguir controlar seus sintomas. A isso se dá o nome de hiperfoco, ou seja, a pessoa consegue se manter extremamente focada.
No entanto, em geral isso só se dá em atividades que dão prazer ao indivíduo, não sendo possível esse controle dos sintomas em outras atividades, principalmente atividades impostas como estudar para uma prova ou ler um livro para um trabalho acadêmico.
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Embora seja muito conhecido nas escolas por ser um transtorno que prejudica o desempenho escolar, é importante lembrar que o TDAH é crônico e pode trazer prejuízos também aos adultos.
Se você sente que tem problemas de atenção que realmente atrapalham a sua vida, procure um psiquiatra ou psicólogo de confiança.
Referências
Rohde, L. A. & Halpern, R. (2004). Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: atualização. Jornal de Pediatria, 80(2): S61-S70. Sociedade Brasileira de Pediatria. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/%0D/jped/v80n2s0/v80n2Sa08.pdf, acesso em 28/02/2019.