Transtorno Obsessivo-Compulsivo: neurônios e astrócitos trabalham juntos, afirma estudo

Pesquisa mostra mecanismos a nível celular e molecular que contribuem para os sintomas do TOC
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Um estudo feito por pesquisadores da Universidade da Califórnia (UCLA) e publicado no periódico científico Nature descobriu que, quando se trata do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), é possível que dois tipos de células cerebrais (neurônios e astrócitos) estejam trabalhando juntos na manutenção dos sintomas. O achado tem relevância pois identifica um possível mecanismo por trás dos sintomas do transtorno, ajudando na pesquisa e desenvolvimento de novos tratamentos que podem ter uma eficácia maior futuramente.

O que são neurônios e astrócitos?

Os neurônios são o principal tipo de célula presente no sistema nervoso, sendo responsáveis pela transmissão de impulsos nervosos. Essas células apresentam propriedades diferentes de acordo com a região do cérebro em que se encontram.

Alguns neurônios são mais especializados em receber estímulos externos, enquanto outros são responsáveis por permitir o raciocínio lógico e o pensamento verbal.

Em outras palavras, são os neurônios que permitem tanto a captação e processamento de estímulos sensoriais como processos mais complexos como o pensamento, as emoções, o planejamento de ações, entre outros.

Já os astrócitos são outro tipo de célula fundamental do sistema nervoso central. Assim como os neurônios, os astrócitos apresentam propriedades diferentes de acordo com a região do cérebro em que estão.

De um modo geral, entende-se que os astrócitos são células de suporte aos neurônios, ou seja, são células que ajudam os neurônios a continuarem funcionando corretamente. Dentre suas funções estão: regular o fluxo sanguíneo dos neurônios, transferir energia ao neurônio, promover os componentes essenciais de neurotransmissores, entre outros.

Os astrócitos e os neurônios interagem de forma extensa no cérebro. Enquanto muitos transtornos mentais são popularmente conhecidos como “desequilíbrios de neurotransmissores”, estudos mostram que é possível que a interação entre neurônios e astrócitos esteja envolvida nesses desequilíbrios.

Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC): o que se sabe

O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é caracterizado pela presença de pensamentos intrusivos que geram angústia, levando a pessoa a realizar atos compulsivos e repetitivos para aliviar esse sentimento.

Embora os comportamentos para lidar com essa angústia variem de pessoa para pessoa, alguns comportamentos comumente observados são higienizar-se com frequência desnecessária, organizar objetos de forma simétrica, entre outros. Existem também atos compulsivos mentais, que são realizados apenas na mente do indivíduo, como contar ladrilhos, por exemplo.

Grande parte das pessoas é acometida por pensamentos intrusivos desagradáveis, mas as pessoas diagnosticadas com TOC têm esses pensamentos com frequência e intensidade tão grande que isso chega a ser prejudicial para o seu funcionamento no dia-a-dia.

Em outras palavras, a pessoa pode acabar “perdendo” muito tempo em seus atos compulsivos para tentar lidar com os pensamentos intrusivos, fazendo com que não consigam dar a devida atenção às outras tarefas que precisam realizar para levar uma vida funcional.

Embora os sintomas apareçam já durante a infância e adolescência em grande parte dos casos, o diagnóstico costuma ser feito só na idade adulta.

O tratamento do TOC é feito com psicoterapia e medicamentos, em especial antidepressivos. No entanto, o transtorno em si é pouco compreendido e com frequência há resistência ao tratamento. Em outras palavras, existem muitos casos em que o tratamento não é tão efetivo quanto se espera. A pessoa apresenta certa melhora, mas ainda tem sintomas que a impactam significativamente.

Em casos muito graves, o TOC pode ser confundido com um transtorno psicótico, pois os pensamentos intrusivos beiram o delírio.

Saiba mais em Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC): o que é, sintomas e mais

O que diz a pesquisa?

Ao estudar as proteínas presentes nos neurônios e astrócitos de ratos, os pesquisadores perceberam a presença da proteína SAPAP3 em ambos os tipos de células. Essa proteína é conhecida por estar associada a comportamentos repetitivos e sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo.

O estudo foi feito analisando os proteomas (conjunto de proteínas) em neurônios e astrócitos numa parte do cérebro chamada corpo estriado. Essa parte do cérebro está envolvida na tomada de decisões e no controle motor, e estima-se que tem um papel importante na manutenção dos sintomas do TOC.

De acordo com os pesquisadores, no TOC, há um mal funcionamento do circuito de neurônios do corpo estriado, resultando nos sintomas apresentados. No entanto, pouco se sabia sobre esse mal funcionamento a um nível celular e molecular até então.

A pesquisa com astrócitos era difícil até pouco tempo atrás, pois a tecnologia disponível não permitia que fosse possível analisá-los sem comprometer sua integridade. Contudo, atualmente, avanços tecnológicos permitem que essa análise seja feita, possibilitando a condução de estudos como este.

Pesquisas anteriores costumavam focar na expressão de genes, enquanto este foca na expressão das proteínas diretamente. Isso é importante porque, de acordo com os pesquisadores, é pelas proteínas presentes na célula que é possível entender a função daquela célula em específico.

Após descobrir a presença da proteína SAPAP3 em ambos os tipos de célula, os pesquisadores usaram ratos que não tinham o gene para produção da proteína e, portanto, não tinham essa proteína em seus sistemas nervosos. Estes animais apresentavam comportamentos semelhantes aos sintomas do TOC, como limpar-se compulsivamente.

Entende-se que o TOC pode estar relacionado com alterações no gene que produz a SAPAP3, fazendo com que a proteína em si sofra alterações também. Ao reintroduzir a proteína em animais sem o gene, observou-se uma melhora nos comportamentos semelhantes aos sintomas de TOC.

Os pesquisadores reintroduziram a proteína tanto em neurônios quanto nos astrócitos. No entanto, a reintrodução da proteína apenas em astrócitos não apresentou melhora dos sintomas, mas a reintrodução nos neurônios sim.

Isso pode indicar que novos tratamentos para TOC podem ser baseados a nível celular tendo como alvo tanto neurônios quanto astrócitos para potencializar os efeitos. No entanto, trabalhar apenas com os astrócitos pode não ser tão eficaz.

Embora existam tratamentos eficazes para o TOC, há também pacientes que não respondem de forma adequada e, por isso, mais estudos precisam ser realizados a fim de encontrar alternativas para essas pessoas. Esta é mais uma das pesquisas que contribuem para o surgimento dessas alternativas.

Se você sofre com sintomas de TOC ou conhece alguém que apresenta estes sintomas e tem sua vida prejudicada por isso, não hesite em procurar um profissional da saúde mental!

Referências

Soto, J. S., Jami-Alahmadi, Y., Chacon, J. et al. (2023). Astrocyte–neuron subproteomes and obsessive–compulsive disorder mechanisms. Nature 616, 764–773. https://doi.org/10.1038/s41586-023-05927-7

https://www.genengnews.com/topics/translational-medicine/study-finds-brain-astrocytes-and-neurons-work-together-in-obsessive-compulsive-disorder/
https://neurosciencenews.com/ocd-astrocytes-22996/

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