A terapia cognitivo-comportamental, frequentemente chamada de TCC, é um tipo de psicoterapia cujo foco é trabalhar a reestruturação cognitiva, ou seja, ajudar a pessoa a mudar seus pensamentos e crenças disfuncionais que acabam prejudicando seu emocional.
Trata-se de um tipo de terapia que pode ajudar pessoas que sofrem de diversos transtornos mentais, mas também pode ajudar pessoas que não possuem diagnósticos ao identificar e modificar padrões de pensamento e comportamento que podem ser prejudiciais ao seu funcionamento.
A TCC se utiliza de uma série de técnicas para conseguir alcançar seus objetivos, como o questionamento socrático, as tarefas de casa, entre outros. Porém, uma técnica pouco comentada é o uso de imagens mentais, que pode ajudar pessoas na regulação emocional.
A técnica é bastante eficaz no tratamento do transtorno afetivo bipolar, mas pode ajudar pessoas que sofrem de diversos transtornos, como depressão, ansiedade, traumas e fobias.
O que são imagens mentais?
Imagens mentais são informações sensoriais que aparecem na mente quando uma pessoa tem um pensamento ou um sentimento. Em outras palavras, não se trata apenas de algo visual, podendo ser também cheiros, sons, entre outros.
Muitas vezes, os pensamentos e crenças disfuncionais vem acompanhados de imagens mentais que causam reações emocionais e fisiológicas negativas, ou seja, imagens mentais igualmente distorcidas e disfuncionais.
Assim como no caso dos pensamentos distorcidos, as imagens mentais podem ter grande influência no comportamento. Na terapia, busca-se ajudar o paciente a substituir essas imagens mentais prejudiciais por outras mais adaptativas, ou seja, que não provocam sensações e reações danosas.
Embora a TCC costume fazer muitas intervenções diretamente nos pensamentos, estudos mostram que as intervenções utilizando imagens mentais costumam ter um impacto ainda maior nas emoções. Há também estudos que mostram que imagens positivas levam a emoções positivas, aumentando as chances da pessoa realmente realizar o comportamento imaginado e desejado.
Imagens nos transtornos mentais
Alguns transtornos mentais tem como sintoma a presença de imagens mentais angustiantes, como é o caso do Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). No entanto, esse não é o único transtorno no qual as imagens mentais impactam. Além disso, as imagens mentais tem efeitos diferentes de acordo com o transtorno em questão. Entenda:
Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)
No TEPT, as imagens mentais surgem de forma intrusiva na forma de flashbacks do momento traumático. Essas imagens causam intensa angústia, pois são revividas como se estivessem acontecendo no momento presente. Elas também podem despertar sintomas ansiosos que levam a pessoa a ter comportamentos evitativos.
Depressão
Na depressão, nota-se uma menor quantidade de imagens mentais positivas. A pessoa pode ter imagens mentais negativas com frequência, mas as imagens mentais positivas são fracas ou insuficientes para ajudar a pessoa a regular-se emocionalmente.
Transtorno bipolar
Caracterizado pela presença de episódios depressivos e episódios maníacos, no transtorno bipolar as imagens mentais podem influenciar na ciclagem entre esses episódios. Imagens mentais negativas podem reforçar sintomas depressivos, enquanto imagens mentais positivas podem aumentar os sintomas de mania.
Vale ressaltar que os episódios de humor no transtorno bipolar podem surgir por conta de gatilhos, que frequentemente vem acompanhados de imagens mentais.
Ansiedade
A ansiedade pode ser descrita como um sentimento de medo e apreensão diante de uma ameaça futura percebida, ou seja, a ameaça não está presente no momento, mas é algo que a pessoa teme que aconteça.
Nos casos de ansiedade, as imagens mentais estão relacionadas a cenários futuros que podem ter consequências negativas, como gaguejar em uma apresentação pública ou desencadear uma discussão séria ao verbalizar suas insatisfações em um relacionamento, por exemplo.
Fobias
No caso das fobias, as imagens mentais angustiantes são relacionadas ao objeto fóbico e tem a característica intrusiva. Uma pessoa com fobia de germes pode imaginar cenários em que contrai algum patógeno que ameaça sua vida, por exemplo.
Como as imagens mentais podem ajudar na terapia?
As imagens mentais são um recurso muito válido na terapia por conseguir os seguintes resultados:
Internalização de mudanças cognitivas
Não é raro que uma pessoa consiga questionar seus pensamentos distorcidos, mas ainda assim continua sentindo as emoções negativas que os acompanham. Nesses casos, o uso de imagens mentais pode ajudar a pessoa a internalizar essas mudanças cognitivas, tendo impacto também no seu emocional.
Diminuir a intensidade de emoções negativas
O surgimento de imagens mentais angustiantes pode desencadear ou manter emoções negativas e/ou desconfortáveis. As técnicas de imagens mentais podem ajudar a diminuir a intensidade dessas emoções.
Decastatrofização
A catastrofização é uma distorção cognitiva que faz com que a pessoa pense sempre no pior cenário possível a partir de uma situação. Nestes casos, é comum o surgimento de imagens mentais bastante angustiantes.
Com a ajuda de imagens mentais, o paciente pode imaginar outros cenários possíveis, imaginando também qual deles seria o mais provável baseado em evidências da situação atual.
Aumentar os comportamentos adaptativos
Comportamentos adaptativos são aqueles que trazem consequências desejadas e vantajosas, como é no caso de habilidades e mecanismos de enfrentamento.
Imaginar a si mesmo colocando essas habilidades em prática aumenta as chances de realmente colocá-las em prática, bem como ajuda a lidar melhor com as emoções associadas ao enfrentamento de situações desagradáveis.
Responder de forma apropriada às situações
Com o uso de imagens mentais, o paciente pode testar possibilidades de comportamento diferentes e identificar qual comportamento poderia ser o mais apropriado em uma situação específica.
Como as imagens mentais são usadas na terapia?
A utilização das imagens mentais na psicoterapia segue as seguintes etapas:
- Ensinar sobre imagens mentais ao paciente;
- Ajudar o paciente a recordar e identificar suas imagens mentais disfuncionais;
- Modificar ou substituir imagens mentais angustiantes.
Ensinar sobre imagens mentais
Em um primeiro momento, o paciente é convidado a entender o significado do termo “imagens mentais”. Para alguns pacientes, é fácil descrever suas imagens mentais mesmo sem ter esse conhecimento. Para outros, pode haver hesitação por conta de julgamentos da própria pessoa em relação às coisas que pensa, vê e sente.
O terapeuta pode começar a ensinar sobre imagens mentais dizendo o seguinte:
“Imagens mentais são as imagens que existem na mente, podendo conter qualquer um dos 5 sentidos (visão, audição, olfato, paladar e tato). É possível “ouvir” os sons ao imaginar uma cena, por exemplo. Também é possível cheirar, sentir ou provar o gosto das coisas dentro da imaginação. Essas imagens podem ser momentâneas, rápidas e turvas, surgindo de forma espontânea, mas também podem ser de longa duração e surgir a partir de uma imaginação ativa.”
Com isso, o paciente começa a ter uma noção maior do que são imagens mentais e pode compartilhar com mais facilidade o conteúdo das imagens mentais que trazem angústia.
Recordar e identificar imagens mentais
Embora, em muitos casos, as imagens mentais surjam espontaneamente no discurso do paciente durante a terapia, às vezes é necessário que o terapeuta ajude o paciente a recordar e identificar imagens mentais que o trazem prejuízo.
Para isso, o terapeuta pode perguntar quais são as imagens mentais associadas aos sentimentos e pensamentos que o paciente relata, pedindo-o para descrever como eles se parecem.
Algumas perguntas que o terapeuta pode fazer são:
- Quando você pensou nisso, o que você imaginou?
- O que você consegue imaginar quando pensa sobre tal coisa?
- Quando você sente determinada emoção, como você a imagina?
Modificação de imagens mentais
Após a identificação de imagens mentais prejudiciais, o terapeuta irá trabalhar junto ao paciente para modificar essas imagens. Isso pode ser feito por meio de diversas técnicas diferentes, tais como:
Enxergar além da imagem
Ao lidar com situações que provocam grande ansiedade, muitas pessoas têm dificuldade em ver um desfecho, pois a ansiedade toma conta e a pessoa não consegue imaginar como a situação como um todo poderia ser. A ideia desta técnica é ajudar a pessoa a conseguir imaginar possíveis desfechos para a situação, o que diminui a catastrofização ao considerar diferentes cenários.
Por exemplo, uma pessoa que sofre de algum grau de ansiedade social pode ter muitas dificuldades para participar de eventos sociais, como uma festa na casa de um amigo. O terapeuta irá perguntar, então, como a pessoa imagina que será a festa. Ao descrever o cenário, a pessoa entra em contato com sensações que acredita que irá sentir, e o terapeuta a ajuda a ir além dessas sensações.
Se a pessoa descreve se sentir fisicamente mal por conta da ansiedade, o terapeuta busca explorar as possibilidades de ação a partir desse momento, ajudando-a a ver possíveis desfechos que não são tão catastróficos quanto acredita.
Salto temporal
O salto temporal é parecido com a técnica de enxergar além da imagem, porém considera um tempo maior. Esse tipo de técnica pode ser útil quando a pessoa está lidando com algum problema que não vai ser resolvido a curto prazo, como no caso de separações, lutos, perdas, dificuldades financeiras, entre outros.
O terapeuta pode pedir ao paciente que imagine sua vida dali a alguns meses ou até mesmo anos, ajudando-o a imaginar uma situação na qual superou a dificuldade atual. Com isso, o paciente consegue ter mais clareza de que uma situação, por mais intensa e dolorosa que seja, não é para sempre.
Modificação da imagem atual
Nesta técnica, o paciente irá imaginar as formas com as quais lida com um problema. Com frequência, essas formas não alcançam os resultados desejados e, por isso, com a ajuda do terapeuta, o paciente tentará imaginar formas diferentes de abordar a questão, identificando os comportamentos que podem levar a desfechos mais favoráveis.
Enfrentamento dentro da imagem
Esta técnica é muito similar à modificação da imagem atual, mas nela é trabalhada uma habilidade de enfrentamento específica. Neste sentido, a pessoa não precisa estar passando por um problema real no momento, mas pode indicar imagens mentais de situações que gostaria de trabalhar melhor.
Vale lembrar que emitir um comportamento dentro de uma imagem mental aumenta as chances de emitir esse mesmo comportamento na realidade. Por conta disso, praticar habilidades de enfrentamento na imaginação pode ajudar a pessoa a reforçar esse comportamento, para que consiga agir de forma adequada quando uma situação real surgir.
Diminuir a intensidade
Vez ou outra, as imagens angustiantes não são baseadas na realidade, sendo produto de uma ameaça percebida que, na realidade, pode não ser tão prejudicial. Essa é uma técnica bastante usada para o tratamento de fobias e catastrofização, ajudando o paciente a gradualmente aproximar a imagem mental a desfechos mais realistas.
Uma pessoa com fobia de aranhas, por exemplo, pode ter uma imagem mental de ser atacada por aranhas ao vê-las. Contudo, na realidade, grande parte das espécies de aranhas são inofensivas, e das espécies que têm importância médica, a maioria não é agressiva.
Neste caso, o terapeuta pode ajudar a pessoa a identificar que essa imagem mental seria uma representação do pior desfecho possível, encorajando a pessoa a imaginar outros desfechos que estão mais próximos da realidade de quando uma pessoa encontra uma aranha.
As imagens mentais têm uma influência muito grande na regulação emocional e na internalização das mudanças cognitivas feitas durante a terapia. No entanto, trata-se de um recurso pouco falado, mesmo que seja bastante utilizado.
Se você reconhece que possui imagens mentais angustiantes que causam prejuízos no dia-a-dia e na saúde emocional, não hesite em contatar um profissional da saúde mental!
Referências
Pearson J, Naselaris T, Holmes EA, Kosslyn SM. Mental Imagery: Functional Mechanisms and Clinical Applications. Trends Cogn Sci. 2015 Oct;19(10):590-602. doi: 10.1016/j.tics.2015.08.003. PMID: 26412097; PMCID: PMC4595480.
https://www.therapistaid.com/therapy-guide/using-imagery-in-cbt