O ambiente de trabalho é um lugar presente em grande peso na vida das pessoas. Hoje em dia, estima-se que, em média, uma pessoa passe cerca de um terço (⅓) do seu tempo de vida trabalhando.
Em outras palavras, o trabalho é um espaço que toma um tempo considerável do dia-a-dia de uma pessoa. Portanto, é fundamental que o ambiente de trabalho seja um lugar em que a pessoa se sente bem. Do contrário, o trabalho pode impactar sua saúde mental de forma geral, mesmo fora do expediente.
No momento, a depressão é uma das principais causas de incapacidade laboral e, segundo a OMS, o transtorno pode chegar a custar 1 trilhão de dólares por ano à economia global. No Brasil, os transtornos mentais estão em terceiro lugar nas causas de procura do auxílio-doença.
Além disso, segundo um levantamento da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) em 2023, cerca de 52% dos trabalhadores relatam ter ansiedade no trabalho.
Neste texto, iremos conceitualizar a saúde mental no ambiente de trabalho, entender como o trabalho pode impactar a saúde mental e oferecer dicas, tanto para trabalhadores quanto para empresários, para promover e auxiliar na manutenção da saúde mental nesse ambiente.
O que é saúde mental no ambiente de trabalho?
A saúde mental no ambiente de trabalho pode ser compreendida como o bem-estar psicológico dentro do contexto profissional, abarcando sentimentos de resiliência, satisfação e realização no trabalho.
Não significa necessariamente a ausência de transtornos mentais entre os trabalhadores, mas se refere a prevenção do trabalho como um contribuinte para quadros psicológicos delicados.
Em outras palavras, quando falamos de saúde mental no trabalho, estamos falando em manejo do estresse, criação de uma cultura organizacional saudável, manutenção da saúde mental neste ambiente como um todo, bem como equilíbrio entre demandas profissionais e o bem-estar.
Como o trabalho pode impactar a saúde mental?
O ambiente de trabalho pode contribuir para o declínio da saúde mental de diversas formas, como:
- Carga excessiva de trabalho;
- Demandas e metas excessivas;
- Jornadas de trabalho irregulares;
- Acúmulo de tarefas;
- Autonomia dos colaboradores altamente limitada;
- Relações hostis entre os trabalhadores;
- Assédio moral e sexual;
- Discriminação de gênero, raça e orientação sexual;
- Tratamento desigual entre funcionários;
- Insegurança sobre estabilidade no emprego;
- Falta de reconhecimento e oportunidades de crescimento;
- Estigma em relação a saúde mental;
- Descumprimento de protocolos de segurança em trabalhos perigosos, entre outros.
Todos esses fatores são estressores que podem contribuir para um grande mal estar entre os trabalhadores, de forma a impactar sua saúde mental, mesmo que previamente não tivessem qualquer problema nesse sentido.
Além disso, pessoas que já são diagnosticadas com transtornos mentais podem ter seus sintomas agravados no ambiente de trabalho quando não há preocupação da empresa com a saúde mental e bem-estar de seus colaboradores.
O que acontece se uma empresa não liga para a saúde mental dos funcionários?
Quando a saúde mental e o bem-estar dos colaboradores não está entre as prioridades da empresa, uma série de problemas podem ocorrer. Dentre eles:
- Altos níveis de estresse;
- Absenteísmo (quando o trabalhador precisa faltar com frequência, geralmente para cuidar da saúde);
- Presenteísmo (quando a pessoa vai ao trabalho, mas não consegue realizar suas tarefas, não produzindo de fato);
- Afastamentos (temporários ou definitivos);
- Insatisfação dos colaboradores;
- Alta rotatividade (muitos funcionários entram e saem da empresa);
- Problemas nas relações interpessoais;
- Desenvolvimento de transtornos mentais.
Vantagens de cuidar da saúde mental dos trabalhadores
Já quando a empresa promove um bom ambiente e clima organizacional preocupado com a saúde mental, a própria empresa se beneficia não só com uma boa produtividade dos trabalhadores, mas também gerando fidelidade desses colaboradores, retendo talentos, diminuindo a rotatividade e evitando problemas como o burnout e afastamentos por questões de saúde física e mental.
Transtornos mentais associadas ao trabalho
Quando o ambiente de trabalho é hostil e pesado, é comum que surjam alguns transtornos mentais em seus trabalhadores. Os mais frequentes são:
Estresse crônico
O estresse crônico é uma condição fisiológica, ou seja, não se trata de um transtorno mental em si, mas é uma condição preocupante de qualquer forma, pois pode acarretar tanto em problemas físicos quanto contribuir para o surgimento de transtornos mentais de fato.
O problema ocorre quando a pessoa passa por períodos de estresse prolongados, e o sistema endócrino libera hormônios chamados corticosteroides. Esses hormônios não são ruins por si só, mas em grandes quantidades podem causar problemas.
Dentre os sintomas do estresse crônico estão dificuldades para relaxar, humor instável, irritabilidade, sentimentos depressivos, dificuldades de concentração, ansiedade, insônia, cansaço excessivo, problemas digestivos, sudorese, diminuição da libido, baixa na imunidade, entre outros.
Depressão
A depressão pode tanto surgir em relação ao estresse crônico passado no trabalho como também ser agravada por ele. Mesmo que uma pessoa desenvolva depressão fora do ambiente de trabalho, conviver com condições de trabalho prejudiciais pode agravar bastante o quadro.
Os principais sintomas da depressão são humor deprimido (sentimentos de tristeza, melancolia etc.), falta de motivação, falta de interesse em coisas que antes gostava de fazer, dificuldade em sentir prazer, problemas de autoestima, pensamentos negativos frequentes, entre outros.
Ansiedade
A ansiedade é uma reação normal do organismo mas, quando ocorre em momentos inapropriados e de forma intensa, torna a apresentar características patológicas, dando origem aos transtornos de ansiedade.
No ambiente de trabalho, é possível uma pessoa desenvolver ansiedade por conta de demandas e metas que precisa alcançar, pelas relações hostis em ambiente de trabalho, pela sensação de insegurança e medo de ser demitida, entre outros.
Síndrome de burnout
A síndrome de burnout é caracterizada como uma exaustão emocional causada pelo trabalho, tendo como sintomas a despersonalização, humor deprimido, e pode diminuir drasticamente o desempenho do colaborador.
Apesar dos sintomas serem muito parecidos com uma depressão, essa síndrome é exclusivamente laboral, ou seja, é uma síndrome diretamente relacionada à qualidade da relação que a pessoa tem com o trabalho.
Ambientes de trabalho que criam pressões demasiadas podem levar uma pessoa a desenvolver uma relação bastante tóxica com a vida profissional, resultando na síndrome de burnout.
Quando uma pessoa sofre dessa síndrome, o único tratamento possível é o afastamento do trabalho. Mesmo que faça um tratamento normal para a depressão, por exemplo, este não é efetivo, pois o problema da pessoa não é depressão, e sim uma relação de má qualidade com o seu trabalho.
Sinais de que o trabalho está impactando a saúde mental dos trabalhadores
Se você tem uma empresa ou trabalha em uma que está impactando a saúde mental dos trabalhadores, é possível perceber alguns sinais do problema. Os trabalhadores passam a apresentar os seguintes comportamentos:
- Mudanças de humor;
- Dificuldade de concentração nas tarefas;
- Aumento da frequência de erros e acidentes;
- Irritabilidade;
- Isolamento social;
- Cansaço;
- Desânimo;
- Problemas de saúde física frequentes;
- Falta de motivação;
- Ganho ou perda de peso em um curto espaço de tempo;
- Sono durante o expediente, indicando alterações no padrão de sono;
- Isolamento dos colegas;
- Consumo de álcool e substâncias (mesmo fora do ambiente de trabalho, ainda pode impactar na vida profissional);
- Crises de choro;
- Crises de ansiedade.
Como melhorar a saúde mental no trabalho?
A lei entende que a manutenção da saúde mental no ambiente de trabalho é de responsabilidade da empresa, e não do indivíduo em si. No entanto, como trabalhadores, existem algumas coisas que podem ajudar indiretamente a manter a saúde mental nesse ambiente:
Ter hábitos saudáveis
A manutenção de hábitos saudáveis, como uma alimentação equilibrada, prática de exercícios físicos, consultas regulares a profissionais da saúde (física e mental), entre outros, geralmente tem um impacto positivo sobre a saúde mental como um todo, o que certamente reflete na vida profissional.
Ter uma identidade desvinculada do trabalho
Nosso senso de identidade é uma questão muito importante para a manutenção da saúde mental.
No entanto, quando essa identidade está ligada somente ao trabalho, torna-se um fator que contribui para o aparecimento de problemas como síndrome de burnout, sintomas de depressivos e ansiosos, considerando que o trabalho é a única coisa que define a pessoa.
Portanto, criar um senso de identidade desvinculado do trabalho é de suma importância para manter a saúde mental não só enquanto está ativamente trabalhando, mas também para momentos como a transição para aposentadoria.
Para fazer isso, é necessário prestar atenção em outras coisas importantes na vida, como tempo de lazer, hobbies, família, vida social, entre outros. Se você percebe que não tem alguma dessas coisas, começar a cultivá-las pode ser uma boa ideia.
Respeitar limites entre vida profissional e vida pessoal
Além de ter uma identidade desvinculada do trabalho, é importante saber separar a vida profissional da vida pessoal, no sentido de não permitir que o trabalho tome tempo fora do expediente.
Por isso, é importante se desconectar das redes do trabalho fora do expediente, evitar responder mensagens relacionadas ao trabalho, seja por e-mail ou aplicativos de mensagem instantânea, evitar terminar fora do horário de trabalho aquilo que você não conseguiu terminar no expediente, entre outros.
Cuidar da saúde mental como um todo
Por último mas não menos importante é cuidar da saúde mental como um todo, tratando questões que não estão relacionadas ao trabalho.
Se você tem um diagnóstico de algum transtorno mental, manter o tratamento em dia não só ajuda na qualidade de vida como também combate potenciais problemas referentes ao trabalho.
O que empresas podem fazer para melhorar a saúde mental no trabalho?
A manutenção da saúde mental no ambiente de trabalho não é responsabilidade única do trabalhador, mas também da empresa.
Além de ajudar na satisfação geral dos colaboradores, outras vantagens que a empresa tem ao prestar atenção na saúde mental são:
- Maior produtividade;
- Retenção de talentos;
- Redução do absenteísmo e presenteísmo;
- Prevenção de transtornos mentais e consequentes afastamentos;
- Maior responsabilidade social, rendendo uma boa imagem para a empresa.
Portanto, aqui estão algumas coisas que a empresa pode fazer para contribuir:
Programas de conscientização e prevenção
Para ajudar na saúde mental dos trabalhadores, a empresa não pode considerar essa questão um tabu.
Promover programas de conscientização e prevenção é um primeiro passo para ajudar na saúde mental dos colaboradores. Eventos que incentivam a resiliência psicológica também podem trazer bons resultados.
Isso tudo pode ser feito por meio de palestras e oficinas ministradas por profissionais da saúde mental.
Além disso, é interessante promover um espaço de escuta psicológica dentro da empresa, para questões relacionadas ao trabalho, à parte de terapia individual do trabalhador (que ele pode optar por fazer ou não).
Oferecer benefícios de saúde mental
Benefícios como planos de saúde que cobrem profissionais da psiquiatria e psicologia já ajudam bastante em manter a saúde mental dos trabalhadores em dia.
Além disso, também é possível realizar um convênio com clínicas de saúde mental.
Manter um clima organizacional agradável
Um clima organizacional amigável, no qual não há competitividade entre colaboradores, não há embates e cobranças desnecessárias, pode fazer toda a diferença na saúde mental dos funcionários.
Permitir uma cultura de feedback
Uma cultura de feedback que permite o diálogo sobre saúde mental entre colaboradores e gerência faz com que os trabalhadores se sintam ouvidos e acolhidos.
Contudo, não basta apenas ouvir o feedback, mas também acatar e aplicar as mudanças sugeridas pelos funcionários, na medida do possível.
Evitar sobrecarga de trabalho e acúmulo de tarefas
É claro que a empresa deseja que os funcionários apresentem uma boa produtividade, mas é importante tomar cuidado para não sobrecarregar os trabalhadores.
Evite também abrir vagas que exigem uma grande quantidade de tarefas a serem executadas por uma mesma pessoa.
Remuneração adequada
Um fator que influencia muito na saúde mental relacionada ao trabalho é justamente a questão da remuneração. Os trabalhadores merecem receber remuneração proporcional à quantidade de tarefas que realizam, bem como sua produtividade.
Quando falamos de remuneração, não falamos apenas de salário, mas também benefícios como vale alimentação, planos de saúde, programas de avanço de carreira, entre outros.
Oferecer oportunidades de crescimento
As oportunidades de crescimento são imprescindíveis para combater sentimentos de estagnação no trabalho, que são bastante prejudiciais para a saúde mental como um todo, em especial para colaboradores que tem a ambição de construir carreira dentro da empresa.
Estimular o equilíbrio entre vida pessoal e trabalho
É necessário evitar que o trabalho e a produtividade sejam preocupações para o trabalhador fora do expediente.
Portanto, deve-se evitar mandar e-mails, comunicação e cobranças fora do expediente, bem como deixar claro para os colaboradores que o tempo fora do expediente é um tempo para descanso e lazer, não devendo ser preenchido com questões do trabalho.
A empresa pode ajudar ao lembrar ao colaborador que, além de trabalhador, ele é uma pessoa completa, que necessita de sua individualidade, autonomia e tempo de lazer.
Lei nº 14.831: o que é? Como ajuda na saúde mental dos trabalhadores?
Em março de 2024, foi sancionada a Lei nº 14.831, que instituiu o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental. A lei tem como objetivo promover o cuidado com a saúde mental e a inclusão no ambiente de trabalho.
A certificação indica que a empresa investe ativamente na saúde mental e bem-estar dos colaboradores.
Para que uma empresa obtenha a certificação, ele precisa:
- Implementar programas de saúde mental;
- Oferecer recursos de apoio psicológico e psiquiátricos aos trabalhadores;
- Conscientizar sobre saúde mental;
- Capacitar lideranças para lidar com questões de saúde mental e inclusão;
- Realizar treinamentos que abordam a temática da saúde mental;
- Combater ativamente discriminação e assédios;
- Promover um ambiente de trabalho seguro e saudável;
- Incentivar o equilíbrio entre vida pessoal e trabalho;
- Incentivar a prática de atividades físicas, alimentação saudável e lazer;
- Incentivar a comunicação integrativa e interações saudáveis no ambiente de trabalho;
- Manter um canal de sugestões e avaliações;
- Prestar contas e agir de forma transparente, desenvolvendo metas e análise de resultados das ações em saúde mental aplicadas na empresa.
Apesar da sanção da lei, não é obrigatório que todas as empresas tenham o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental, e nem é concedido nenhum incentivo fiscal por possuí-lo.
As empresas que atuam conforme essa lei o fazem pois percebem a importância de cuidar da saúde mental dos trabalhadores, além de melhorar sua reputação.
Devido ao tanto de energia que é usada na atividade laboral, o ambiente de trabalho acaba sendo um grande influenciador da saúde mental dos trabalhadores. Por isso, manter a saúde mental neste ambiente não é apenas uma questão de produtividade como também uma questão de saúde pública.
Se você sente que o trabalho pode estar pesando em sua saúde mental, não hesite em contatar um profissional!
Referências
https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/a-importancia-do-cuidado-com-a-saude-mental-no-ambiente-de-trabalho
https://www.spcbrasil.org.br/blog/saude-mental-no-trabalho
https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lanpsy/PIIS2215-0366(16)30024-4.pdf
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/04/01/lei-cria-certificacao-para-empresa-que-promove-saude-mental
https://www.cnnbrasil.com.br/saude/mais-da-metade-dos-brasileiros-sofrem-de-ansiedade-no-ambiente-de-trabalho/
