O transtorno afetivo bipolar (TAB), ou apenas transtorno bipolar, é um transtorno de humor no qual o indivíduo é acometido por episódios de mania ou depressão. Tais episódios ocorrem sem que haja um motivo aparente e podem durar de semanas até meses, trazendo prejuízos na vida do paciente.
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), o principal livro usado por psiquiatras para diagnosticar transtornos, o TAB é categorizado em 3 tipos diferentes: tipo I, tipo II e ciclotimia.
Entretanto, algumas manifestações clínicas não parecem seguir muito bem o que consta no manual, levantando uma série de questões acerca da categorização oficial.
Eis que alguns pesquisadores sugerem a existência de um espectro bipolar, que explicaria melhor as manifestações do transtorno e facilitaria o diagnóstico e tratamento em pessoas que, atualmente, não podem receber o diagnóstico de acordo com os critérios do DSM-5.
O que é o espectro bipolar?
O espectro bipolar pode ser definido como um diagnóstico longitudinal (feito ao longo do tempo) cuja principal característica é uma oscilação de humor anormal englobando estados de mania, hipomania, traços de temperamento, episódios de depressão maior e estados mistos de humor.
Embora não seja oficialmente reconhecido, este tipo de diagnóstico seria útil para o caso de pacientes com TAB porque engloba uma amplitude de manifestações observadas na clínica que não constam no manual diagnóstico, o que resulta em dificuldades no diagnóstico, manejo e remissão destes casos.
Um espectro é como se fosse uma linha na qual há dois extremos e uma variedade de graus entre eles. Um exemplo é o espectro da luz visível, no qual podemos enxergar diversas cores entre determinadas frequências de ondas de luz.
Dentro do espectro, não há como diferenciar exatamente uma coisa e outra. No espectro da luz visível, nota-se isso na transição de uma cor para outra: onde termina o verde e onde começa o azul? Entre essas duas cores, há outras tonalidades como “azul petróleo” e “verde água” que surgem da mistura entre azul e verde.
O mesmo acontece no espectro bipolar: não é possível colocar os sintomas em categorias tão bem definidas como o tipo I e o tipo II, pois há uma imensa variedade de manifestações dos sintomas ao longo do tempo.
Gráfico inspirado em Angst & Cassano (2005)
Tratando o transtorno bipolar como um espectro, abrange-se outras manifestações não especificadas no DSM-5, como é o caso da “depressão moderada + hipomania” e da “hipomania + mania”, além de muitas outras expressões do transtorno que podem aparecer ao longo do espectro.
Além dos sintomas chave do transtorno bipolar, o espectro engloba também traços de temperamento, como é o caso de uma pessoa de temperamento hipertímico (pessoas extrovertidas, otimistas, energéticas etc.). Desta forma, as manifestações do espectro ocorrem mesmo na ausência de um episódio bem definido de humor.
Um outro fator importante sobre o espectro é que a manifestação de uma pessoa pode mudar conforme o tempo. Em um momento da vida, ela poderia apresentar comportamento hipertímico e depressão moderada, enquanto em outro momento poderia apresentar episódios de mania completos e episódios de depressão maior, por exemplo ― tudo isso sem a necessidade de mudar o diagnóstico.
Classificação atual
Como dito anteriormente, o transtorno bipolar atualmente (nos manuais diagnósticos) é dividido em três subtipos:
- Tipo I: Caracterizado pela presença de episódios maníacos e depressivos;
- Tipo II: Episódios de hipomania e episódios depressivos. Não há mania;
- Ciclotimia: Há períodos com sintomas de hipomania ou depressão, mas que não são intensos e nem duradouros o suficiente para caracterizar um episódio de humor.
Antigamente, a principal diferença entre o tipo I e o tipo II era a necessidade de hospitalização: enquanto o tipo I causa prejuízo visível na vida do paciente em episódios de mania beirando a psicose, a pessoa com o tipo II pode até mesmo ser bem vista em episódios de hipomania devido a questões como produtividade e energia aumentadas.
Sendo assim, é muito mais fácil que um paciente com transtorno bipolar tipo I receba atendimento psiquiátrico durante um episódio de mania, não deixando dúvidas acerca de seu diagnóstico, enquanto pacientes com TAB tipo II costumam procurar ajuda apenas em episódios depressivos, podendo ser erroneamente diagnosticados com depressão unipolar.
Subtipos sugeridos
Akiskal e Pinto (1999) desenvolveram protótipos do que seriam o tipo III e IV do transtorno afetivo bipolar, a fim de englobar alguns casos específicos que não são diagnosticados como TAB atualmente. São eles:
Tipo III: hipomania associada a antidepressivos
A hipomania pode acontecer tanto espontaneamente quanto durante o tratamento farmacológico para depressão, e é aí que encontramos um primeiro problema na classificação atual: o diagnóstico de transtorno bipolar requer que os sintomas não sejam causados por substâncias como drogas ou medicamentos e, portanto, nos casos em que a hipomania surge como resposta ao tratamento antidepressivo, este não seria um caso de transtorno bipolar.
Ainda assim, não seria um caso comum de depressão unipolar, pois ela não envolve episódios de hipomania mesmo quando em tratamento com antidepressivos. Ao não diagnosticar o TAB nestes pacientes, nega-se a necessidade de um tratamento focado na estabilização do humor, dificultando a remissão do quadro.
Quando uma pessoa apresenta hipomania quando faz o tratamento com antidepressivos, este seria um caso de TAB tipo III. A hipomania poderia surgir tanto durante o tratamento com antidepressivos quanto após o encerramento do tratamento com estabilizadores de humor.
Tipo IV: depressão hipertímica
Gráfico inspirado em Angst & Cassano (2005)
Tratando o transtorno bipolar como um espectro, abrange-se outras manifestações não especificadas no DSM-5, como é o caso da “depressão moderada + hipomania” e da “hipomania + mania”, além de muitas outras expressões do transtorno que podem aparecer ao longo do espectro.
Além dos sintomas chave do transtorno bipolar, o espectro engloba também traços de temperamento, como é o caso de uma pessoa de temperamento hipertímico (pessoas extrovertidas, otimistas, energéticas etc.). Desta forma, as manifestações do espectro ocorrem mesmo na ausência de um episódio bem definido de humor.
Um outro fator importante sobre o espectro é que a manifestação de uma pessoa pode mudar conforme o tempo. Em um momento da vida, ela poderia apresentar comportamento hipertímico e depressão moderada, enquanto em outro momento poderia apresentar episódios de mania completos e episódios de depressão maior, por exemplo ― tudo isso sem a necessidade de mudar o diagnóstico.
Classificação atual
Como dito anteriormente, o transtorno bipolar atualmente (nos manuais diagnósticos) é dividido em três subtipos:
- Tipo I: Caracterizado pela presença de episódios maníacos e depressivos;
- Tipo II: Episódios de hipomania e episódios depressivos. Não há mania;
- Ciclotimia: Há períodos com sintomas de hipomania ou depressão, mas que não são intensos e nem duradouros o suficiente para caracterizar um episódio de humor.
Antigamente, a principal diferença entre o tipo I e o tipo II era a necessidade de hospitalização: enquanto o tipo I causa prejuízo visível na vida do paciente em episódios de mania beirando a psicose, a pessoa com o tipo II pode até mesmo ser bem vista em episódios de hipomania devido a questões como produtividade e energia aumentadas.
Sendo assim, é muito mais fácil que um paciente com transtorno bipolar tipo I receba atendimento psiquiátrico durante um episódio de mania, não deixando dúvidas acerca de seu diagnóstico, enquanto pacientes com TAB tipo II costumam procurar ajuda apenas em episódios depressivos, podendo ser erroneamente diagnosticados com depressão unipolar.
Subtipos sugeridos
Akiskal e Pinto (1999) desenvolveram protótipos do que seriam o tipo III e IV do transtorno afetivo bipolar, a fim de englobar alguns casos específicos que não são diagnosticados como TAB atualmente. São eles:
Tipo III: hipomania associada a antidepressivos
A hipomania pode acontecer tanto espontaneamente quanto durante o tratamento farmacológico para depressão, e é aí que encontramos um primeiro problema na classificação atual: o diagnóstico de transtorno bipolar requer que os sintomas não sejam causados por substâncias como drogas ou medicamentos e, portanto, nos casos em que a hipomania surge como resposta ao tratamento antidepressivo, este não seria um caso de transtorno bipolar.
Ainda assim, não seria um caso comum de depressão unipolar, pois ela não envolve episódios de hipomania mesmo quando em tratamento com antidepressivos. Ao não diagnosticar o TAB nestes pacientes, nega-se a necessidade de um tratamento focado na estabilização do humor, dificultando a remissão do quadro.
Quando uma pessoa apresenta hipomania quando faz o tratamento com antidepressivos, este seria um caso de TAB tipo III. A hipomania poderia surgir tanto durante o tratamento com antidepressivos quanto após o encerramento do tratamento com estabilizadores de humor.
Tipo IV: depressão hipertímica
O TAB tipo IV se refere a pessoas com traços hipertímicos, parecidos com sintomas de hipomania, mas estáveis (não episódicos) que vivenciam episódios de depressão.
São pessoas que passaram suas vidas inteiras como se estivessem em um episódio de hipomania: otimistas, energizadas, autoconfiantes, extrovertidas, ambiciosas, produtivas, entre outros. Porém, essas pessoas acabam por enfrentar episódios depressivos vez ou outra.
Elas estariam dentro de um espectro bipolar, por apresentarem sintomas tanto de hipomania quanto de depressão, mas não seriam diagnosticadas com TAB na classificação atual por conta da falta de episódios de humor propriamente ditos.
Utilidade do espectro
Mesmo os novos subtipos sugeridos por Akiskal e Pinto não seriam o suficiente para resolver o problema das diversas manifestações do transtorno. No entanto, a existência de um grande número de casos como o tipo III e tipo IV sustentam a hipótese de que o transtorno afetivo bipolar é muito mais complexo do que o que consta no manual.
Manifestações não muito bem definidas como as vistas dentro do espectro ocorrem, com frequência, em pessoas com histórico familiar de TAB. No entanto, ao não serem diagnosticadas, podem ficar sem tratamento até que os sintomas se tornem um grande problema, o que poderia ser evitado se ao menos essas pessoas pudessem receber um diagnóstico e tratamento precoces.
O reconhecimento de um espectro bipolar seria muito útil por promover uma abordagem dimensional da psicopatologia do humor, levando em conta que a presença de sintomas precoces influenciam na formação da personalidade do indivíduo e podem antecipar o desenvolvimento de um transtorno de humor.
Um diagnóstico dimensional seria mais sensível ao processo de “adoecimento”, detectando os sintomas do transtorno bipolar antes de eles se tornarem sérios o suficiente para se encaixarem nos critérios atuais e, portanto, podendo ser administrados antes do surgimento de maiores prejuízos.
Espectro bipolar versus transtorno de personalidade borderline
Tanto o transtorno bipolar quanto o transtorno de personalidade borderline (TPB) possuem sintomas muito parecidos em alguns aspectos. Ambos apresentam grande labilidade emocional (mudanças abruptas de humor) e impulsividade, podendo ser facilmente confundidas.
Contudo, a labilidade emocional e a impulsividade costumam ser sintomas em uma grande variedade de transtornos, mesmo naqueles que não são classificados como transtornos de humor.
Por isso, um dos critérios para diferenciar os dois atualmente seria o fato de que o transtorno bipolar se dá em episódios de humor, ou seja, os sintomas estariam presentes apenas em alguns momentos, ao contrário do TPB, cujos sintomas fariam parte do funcionamento típico do indivíduo.
No entanto, essa diferenciação cairia por terra no caso do espectro bipolar, uma vez que ele engloba também o temperamento da pessoa. Sendo assim, alguns aspectos do transtorno estariam presentes o tempo todo, como parte da personalidade, fazendo com que as duas condições ficassem muito próximas uma da outra.
Se ambas as condições possuem manifestações parecidas, como seria possível diferenciar as duas? Pois bem, a chave estaria no mecanismo por trás do transtorno.
Enquanto o espectro bipolar está relacionado ao humor e algumas anomalias biológicas, a dissociação estaria por trás das manifestações do transtorno de personalidade borderline.
Na realidade, o transtorno de personalidade borderline recebe esse nome pois estaria na fronteira entre dois conceitos psicanalíticos, a neurose e a psicose, que pouco tem a ver com a psiquiatria atual. No entanto, não se pode negar que os sintomas do TPB são reais e são fruto de dissociações.
Sintomas como flashbacks, pesadelos e entorpecimento emocional são frequentes no transtorno de personalidade borderline e são classificados como sintomas dissociativos. Esse tipo de sintoma não ocorre com tanta frequência no transtorno afetivo bipolar, indicando que os sintomas em comum dos dois transtornos não são resultado de um mesmo processo.
Outras diferenças são os traumas sexuais e comportamentos de automutilação que, apesar de estarem presentes em alguns casos de transtorno bipolar também, são características muito mais frequentes no transtorno de personalidade borderline.
Apesar de ser um transtorno muito pesquisado, ainda há muita discussão acerca do diagnóstico do transtorno afetivo bipolar.
Enquanto um espectro poderia detectar o transtorno precocemente e tratar casos que não se encaixam nas categorias atuais, há o medo de que o espectro pudesse fazer com que pessoas que não sofrem com TAB sejam diagnosticadas por engano.
Alguns psiquiatras se guiam pela teoria do espectro bipolar na hora de tratar seus pacientes, evitando problemas como episódios de hipomania induzidos por medicamentos. No entanto, o espectro não é oficialmente conhecido, o que pode prejudicar alguns casos.
Se você acredita sofrer com problemas de humor ou se identifica com algum dos sintomas citados, procure um psiquiatra ou psicólogo de confiança.
Referências
Akiskal, H. & Pinto, O. (1999). The evolving bipolar spectrum. Prototypes I, II, III, and IV. Psychiatr Clin North Am., 22(3): 517-34.
Angst, J. & Cassano, G. (2005). The mood spectrum: improving the diagnosis of bipolar disorder. Bipolar Disord, 7(4): 4-12.
Ghaemi, S. N. & Dalley, S. (2014). The bipolar spectrum: Conceptions and misconceptions. Aust N Z J Psychiatry, 48: 314-325.
Hirschfeld, R. M. A. (2001). Bipolar Spectrum Disorder: Improving Its Recognition and Diagnosis. J Clin Psychiatry, 62(suppl 14): 5-9.