Terapia comportamental-dialética: o que é? Para quem é indicada?

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A terapia comportamental-dialética é um tipo de psicoterapia que tem como foco pacientes de alto risco, isto é, pacientes que representam um risco a si mesmo (ideação suicida) ou aos outros.

Desenvolvida por Marsha M. Linehan, inicialmente esta terapia tinha como foco pacientes com transtorno de personalidade borderline, caracterizado por, dentre outros fatores, emoções intensas e explosivas, bem como uma alta impulsividade e ideação suicida crônica.

O termo “dialética” no nome desta terapia se refere à perspectiva dialética na qual esta abordagem se baseia. Neste sentido, considera-se que tudo está inter-relacionado e segue uma lógica relacional, ou seja, um comportamento sempre ocorre em relação a um contexto.

Por isso, analisar um comportamento de forma isolada da inter-relação que apresenta com outros comportamentos, com o ambiente, com a cultura e o momento da história que a pessoa está vivendo, traz uma compreensão limitada deste comportamento, trazendo prejuízos à terapia como um todo.

A dialética é uma filosofia na qual existe uma tese, uma antítese e uma síntese. A realidade é composta por forças opostas internas (tese e antítese), e a síntese é uma resposta a essa batalha de forças opostas. Quando uma pessoa age de maneira extrema, como é o caso de pacientes suicidas e impulsivos, por exemplo, pode-se pensar que existiu ali uma falha dialética, pois não foi possível uma síntese adequada dessas forças internas.

A terapia comportamental-dialética também é chamada de DBT por conta do seu nome em inglês: Dialectical Behavior Therapy.

A quem a terapia comportamental-dialética é indicada?

Como mencionado anteriormente, ao criar esta terapia, Marsha Linehan estava pensando em pacientes com transtorno de personalidade borderline, que frequentemente se envolvem em situações de risco por conta dos sintomas do transtorno. No entanto, não se trata de uma terapia apenas para pacientes que estão em alto risco.

Pacientes com transtorno bipolar ou depressão unipolar com ideação suicida também podem se beneficiar muito desta terapia, aprendendo as habilidades que ela tem a ensinar e conseguindo alcançar um repertório comportamental que permita a resolução dos seus problemas de forma adequada e sem complicar tanto suas vidas.

A DBT possui técnicas que podem ajudar qualquer pessoa que tenha algum problema com a regulação emocional, independente de diagnóstico. Também pode auxiliar pessoas que apresentam comportamentos autodestrutivos, como pessoas com transtornos alimentares e transtornos de uso de substância.

Como a terapia pode ser feita?

A DBT é uma terapia extremamente versátil e pode ser aplicada em diversos contextos. Enquanto alguns tipos de terapia necessitam de condições bem específicas, a DBT pode ser feita nos seguintes cenários:

  • Treino de habilidades em grupo: Neste cenário, os participantes do grupo aprendem novas habilidades comportamentais por meio de “tarefas de casa”, ou seja, praticar em casa o que aprende nas sessões, bem como por meio de encenações de novas maneiras de interagir com os outros membros do grupo;
  • Terapia individual: A terapia individual consiste em uma relação terapêutica que envolve somente o paciente e o terapeuta e possui algumas vantagens e desvantagens em relação à terapia em grupo. Como desvantagem pode-se destacar a falta de encenações que podem ajudar os participantes a entender como funcionaria aquela nova habilidade, mas como vantagem é possível fazer um plano de tratamento individualizado focado exatamente nos maiores desafios que o paciente deve superar;
  • Coach por telefone: Muitas vezes, durante os meses em terapia, surgem questões que precisam ser resolvidas no momento e o paciente não pode esperar até a próxima sessão para conseguir levar essa questão ao consultório. Para lidar com essa demanda, a DBT permite chamadas telefônicas para que o paciente possa receber orientações para lidar com as dificuldades que está passando no momento. Não substitui a terapia como um todo, mas pode “quebrar um galho”, especialmente quando se trata de pacientes de alto risco que também apresentam altos níveis de impulsividade.

No livro “Treinamento de Habilidades em DBT: manual de terapia comportamental-dialética para o terapeuta”, Linehan ressalta que há diversos ensaios clínicos mostrando que o treino de habilidades sozinho, sem outros tipos de tratamento, tem bastante eficácia em diversos transtornos e problemas, como a depressão, a raiva, a desregulação emocional, a instabilidade afetiva e a intensidade emocional.

Isso não significa que é indicado que uma pessoa que esteja precisando de ajuda busque apenas o treino de habilidades. Cada caso é um caso, e embora o treino sozinho possa ser eficaz, para tirar melhor proveito do tratamento é indispensável fazer uma avaliação com um profissional da saúde mental qualificado, a fim de traçar as estratégias que são mais adequadas para o tratamento das demandas específicas.

Treino de habilidades

O maior carro-chefe da DBT é, definitivamente, o treino de habilidades, que ocorre tanto em grupos quanto de forma individual. Essas habilidades estão separadas em 4 categorias:

Habilidades de mindfulness

O mindfulness é um técnica que visa o envolvimento com o momento presente, ou seja, o foco no aqui e no agora. O propósito do mindfulness é entrar em contato com o mundo ao redor no momento, bem como com seus próprios sentimentos, pensamentos e sensações, de uma forma sem julgamentos.

Essa habilidade é geralmente a primeira a ser treinada, pois é importante para o aprendizado e treinamento de todas as outras habilidades trazidas pela DBT. Conseguir focar no momento presente é de extrema importância para conseguir estabelecer essa relação dialética entre a cognição quente e a cognição fria, para conseguir encontrar novos meios mais adaptativos de lidar com as dificuldades e desafios.

Para ensinar este tipo de habilidade, o terapeuta pode pedir que o paciente tente descrever o que está vendo no momento, evitando julgamentos, bem como o que está ouvindo, o que está sentindo no seu corpo etc. Pode-se inclusive treinar o mindfulness em casa, no dia-a-dia, por exemplo ao comer e contemplar os sabores, texturas, temperaturas e cores dos alimentos, ou ao fazer uma caminhada, prestando atenção no caminho sendo traçado, na natureza que aparece, nos sons que podem ser ouvidos, nos cheiros que surgem, etc.

Para praticar o mindfulness, é necessário prestar atenção no que está acontecendo ao nosso redor, ao invés de prestar atenção apenas aos nossos pensamentos e nos desconectar do momento presente.

Habilidades de tolerância ao mal estar

A tolerância ao mal estar é uma habilidade que todas as pessoas precisam aprender, pois nem sempre as coisas ocorrem do jeito que desejamos e o mal estar é uma realidade que atinge todas as pessoas eventualmente.

Pessoas que têm dificuldades com regulação emocional, por exemplo, podem ter uma dificuldade tremenda em tolerar o mal estar e, para lidar com essa sensação, acaba fazendo alguma coisa prejudicial a si mesma, como usar substâncias ou acabar se envolvendo em algum comportamento autodestrutivo.

As habilidades de tolerância ao mal estar consistem em identificar o mal estar, aceitar sua presença e achar meios de lidar com a crise sem causar maiores prejuízos. Algumas técnicas de tolerância ao mal estar envolvem distração, buscar alternativas para melhorar o momento, tentar técnicas para se acalmar, como se envolver em um cobertor quentinho ou acariciar um animal de estimação, por exemplo.

Ao sentir raiva, colocar uma música em um bom volume e dançar para liberar essa raiva pode ser uma técnica de tolerância ao mal estar, por exemplo. Fazer exercícios físicos ao se sentir ansioso também pode se enquadrar nessa categoria de habilidades, bem como subir e descer as escadas em momentos de inquietação. A ideia é permitir que o corpo lide com a emoção enquanto a pessoa se distrai e permite que o organismo processe essas emoções intensas naturalmente.

Habilidades de efetividade interpessoal

A efetividade interpessoal é importante para manter relações saudáveis, independente do tipo de relacionamento. Frequentemente, nossas emoções podem fazer com que falemos coisas que machucam os outros, ou interpretar de maneira prejudicial o que nos foi dito, causando uma série de conflitos desnecessários.

Por conta disso, as habilidades de efetividade interpessoal podem ajudar muito a manter boas relações. Com estas habilidades, o indivíduo é capaz de impor limites, dizer não quando não se sente à vontade, expressar suas necessidades e desejos de forma positiva e saudável, evitando julgamentos e culpabilizações.

Essas habilidades são frequentemente evocadas na forma de acrônimos que ajudam a pessoa a lembrar de como agir em determinadas situações. Por exemplo, o acrônimo G.I.V.E. (em inglês) ajuda a manter boas conversas com as pessoas, inclusive sobre assuntos delicados, e significa:

  • Seja Gentil (Gentle): Não ataque, ameace ou julgue as pessoas;
  • Demonstre Interesse (Interest): Tenha um envolvimento ao ouvir o outro, não o interrompa, demonstre que há interesse no que a pessoa tem a falar com você;
  • Valide (Validate): A validação da fala do outro é a chave para fazer com que ele se sinta compreendido, o que aumenta muito a qualidade das relações interpessoais. Portanto, busque compreender a validar os pensamentos e sentimentos que a outra pessoa expressa;
  • Adotar um Estilo tranquilo (Easy): Ter um estilo tranquilo e relaxado também contribui para que a relação possa se desenvolver de uma forma mais saudável. Procure sorrir com frequência e manter uma postura alegre e despreocupada, na medida do possível.

Habilidades de regulação emocional

Por fim, a última habilidade a ser trabalhada na DBT é a regulação emocional. Pessoas que não tem uma boa regulação emocional frequentemente têm dificuldades em controlar comportamentos impulsivos, podem ter reações fisiológicas às emoções muito intensas, bem como podem ter dificuldades em manter um funcionamento adequado diante de uma emoção intensa, ou seja, sua capacidade de funcionar depende do seu estado emocional.

Com as habilidades de regulação emocional, a ideia é inibir esses comportamentos impulsivos atrelados a emoções intensas (tanto positivas quanto negativas), tentar reduzir a intensidade da reação fisiológica às emoções, bem como ajudar a pessoa a se organizar para que ela consiga fazer aquilo que precisa fazer independente do seu humor. Por fim, também há técnicas para alterar o foco da atenção diante de emoções muito intensas.

Não se deve confundir regulação com controle emocional. Frequentemente, as pessoas acreditam que precisam aprender a controlar o que sentem, e isso não apenas não é possível como acaba prejudicando ainda mais. Aceitar suas emoções é o primeiro passo para conseguir aprender a se regular emocionalmente. Não se trata de controlar as emoções, pois você continua sentindo tudo, mas sim de aprender a não ser controlado por elas.

As técnicas de regulação emocional ajudam o indivíduo a reconhecer, nomear e lidar com suas próprias emoções de uma maneira saudável, diminuindo a vulnerabilidade emocional e permitindo que a pessoa cultive uma boa relação com suas próprias emoções.

Um exemplo de uma técnica de regulação emocional é identificar o que está sentindo e fazer o contrário. Uma pessoa que está triste e sente que deveria se isolar dos amigos e familiares, por exemplo, está na realidade se sabotando e permitindo que essa tristeza se mantenha por mais tempo. Ir ver os amigos e/ou familiares pode ajudar a mudar o foco da atenção, permitindo que essa tristeza seja processada em segundo plano enquanto se conecta com as pessoas que ama, o que por sua vez ajuda a combater mais sentimentos negativos futuramente.

A terapia comportamental dialética é uma terapia que tem como objetivo auxiliar pacientes  com transtornos severos a conseguir lidar melhor com os seus sintomas a partir do aprendizado de habilidades. Este texto teve como objetivo apresentar brevemente esta terapia, sendo assim ele não substitui um atendimento com um psicólogo ou psiquiatra e nem deve ser levado como recomendação absoluta.

Se você sente que está lidando com questões emocionais ou psicológicas que podem estar te causando sofrimento ou prejuízos de alguma forma, não se esqueça de entrar em contato com um profissional da saúde mental!

Referências

Linehan, M. M. (2018). Treinamento de habilidades em DBT: manual de terapia comportamental dialética para o terapeuta [recurso eletrônico]. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed.

https://www.verywellmind.com/dialectical-behavior-therapy-1067402#what-is-dialectical-behavioral-therapy

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