Fibromialgia e saúde mental: entenda a relação

Caracterizada pela presença de dores musculares crônicas, a fibromialgia frequentemente vem acompanhada de sintomas psiquiátricos. Saiba mais!
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Embora exista uma diferenciação entre saúde física e saúde mental, a verdade é que, muitas vezes, as duas andam juntas. É o caso de pessoas que sofrem de fibromialgia, uma síndrome limitante que frequentemente acompanha sintomas psiquiátricos, sendo bastante comum a presença de comorbidades.

Neste texto, iremos explorar de que forma a síndrome da fibromialgia está relacionada à saúde mental, bem como a forma que o tratamento psicológico também pode ajudar no tratamento da própria síndrome.

O que é fibromialgia?

A fibromialgia é uma síndrome bastante limitante caracterizada por dores intensas de difícil alívio que ocorrem no corpo inteiro. A síndrome é popularmente confundida com um transtorno mental por não ser diagnosticável através de exames e por ter uma correlação significativa com sintomas psiquiátricos, mas não se trata de um transtorno mental.

Dentre os principais sintomas da fibromialgia estão as dores musculares difusas e crônicas, bem como fadiga, sintomas depressivos e distúrbios do sono. Há pesquisas que sugerem que as pessoas que sofrem com a síndrome sofrem alterações na percepção da dor por conta de um funcionamento diferente de alguns neurotransmissores.

Para alguns pacientes, as dores também ocorrem em áreas de maior sensibilidade, chamadas de “pontos de ativação”. Há também relatos de que a dor é mais intensa em um ponto, e posteriormente se torna mais intensa em outro ponto, como se estivesse “andando” pelo corpo.

Outros sintomas frequentemente relatados por pacientes com fibromialgia são enxaqueca, vertigem, zumbido no ouvido (tinnitus), parestesia (sensação de formigamento) e síndrome do intestino irritável.

Não se sabe exatamente a causa da fibromialgia, sendo que boa parte das pessoas que sofrem da síndrome não conseguem identificar se os sintomas surgiram após algum evento específico.

Há casos de pessoas que percebem que seus sintomas apareceram depois de uma infecção viral, algum trauma, exposição prolongada a eventos estressantes ou até mesmo após o uso de medicamentos. Contudo, não se pode considerar esses eventos como causadores do problema.

O diagnóstico da fibromialgia é multifatorial, considerando questões hereditárias, emocionais e ambientais. Isso porque não existe um exame laboratorial ou de imagem capaz de diagnosticar a síndrome, sendo necessária uma avaliação cuidadosa para chegar a esse diagnóstico.

Para que haja o diagnóstico, as dores devem estar presentes por pelo menos 3 meses. A síndrome é mais comum em mulheres do que em homens, sendo frequentemente diagnosticada entre os 30 e 55 anos.

Embora a fibromialgia não ofereça risco de vida, ela não tem cura e pode afetar de forma significativa a vida do paciente, prejudicando seu funcionamento e sua autonomia. O tratamento é feito por médico reumatologista, mas o acompanhamento de profissionais da saúde mental costuma ser importante para amenizar os impactos da síndrome no psicológico.

Qual a relação entre fibromialgia e sintomas de transtornos mentais?

Comorbidades frequentes

O diagnóstico de fibromialgia tem uma grande correlação com a presença de sintomas psiquiátricos, como sintomas depressivos, sintomas ansiosos e até mesmo sintomas de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).

Estima-se que o diagnóstico de um transtorno mental ocorre cerca de um ano antes do diagnóstico da fibromialgia.

No entanto, isso não significa necessariamente que pessoas diagnosticadas com esses transtornos mentais tenham mais chances de desenvolver a fibromialgia, mas indica um grau de comorbidade bastante elevado.

Ciclo de interação entre fibromialgia e transtornos mentais

O problema é que parece existir uma vida de mão dupla: se a fibromialgia aumenta os sintomas de transtornos mentais, os transtornos, por sua vez, também intensificam os sintomas da fibromialgia. Em outras palavras, o emocional e psicológico pode afetar diretamente como os sintomas da fibromialgia se manifestam.

As dores constantes podem aumentar a irritabilidade, além de contribuir para um desgaste emocional que prejudica ainda mais a capacidade de autorregulação do indivíduo. Não raramente, a fibromialgia é diagnosticada em pessoas que passam por um estresse crônico diário, ou seja, pessoas que estão frequentemente lidando com situações estressantes e não conseguem descansar ou ter uma pausa significativa desses estressores.

Nestes casos, a circulação de certos neurotransmissores é afetada, não apenas contribuindo para o surgimento e/ou manutenção de sintomas depressivos e ansiosos, mas também alterando a percepção de dor do indivíduo, fazendo com que perceba como dolorosos alguns estímulos que não seriam dolorosos para outras pessoas.

Limitações e estresse

Além disso, por ser uma condição limitante, a fibromialgia prejudica a pessoa no seu funcionamento normal no dia-a-dia, tornando difícil até mesmo tarefas simples como pentear os cabelos ou preparar um prato de comida. Essa queda na autonomia gera sentimentos negativos na autoestima, prejudicando a autoimagem, contribuindo para o surgimento de sintomas psicológicos.

Outra questão importante a ser ressaltada é que o próprio processo diagnóstico da fibromialgia pode ser bastante estressante, provocando uma piora no quadro. Isso porque a síndrome não é detectada por nenhum exame específico, sendo necessário que a pessoa passe por diversos exames sem alterações nos resultados para constatar o diagnóstico. Enquanto isso, há também tentativas frequentemente frustradas de aliviar os sintomas.

Com isso, pessoas próximas como amigos e familiares podem desacreditar do problema, acreditando que a pessoa está exagerando suas dores, invalidando o que a pessoa está sentindo. Isso também tem um peso bastante significativo na saúde mental da pessoa acometida pela fibromialgia.

Sintomas cognitivos e alterações do sono

Por fim, a fibromialgia também está correlacionada com alguns sintomas cognitivos, como dificuldades de atenção, concentração e problemas de memória. Isso pode ocorrer não apenas por causa da intensidade da dor, que acaba desconcentrando a pessoa, mas também porque as dores prejudicam a qualidade do sono, importante para que a cognição funcione de maneira adequada.

Como é o tratamento?

O tratamento para fibromialgia é feito com medicamentos que buscam controlar os sintomas a curto e longo prazo, como relaxantes musculares e neuromoduladores. No entanto, como a fibromialgia frequentemente vem acompanhada de questões psicológicas, é interessante um tratamento multidisciplinar com psiquiatra e psicólogo para resultados eficazes.

Neste sentido, o tratamento também pode envolver o uso de antidepressivos e ansiolíticos, que ajudam a regular o emocional do paciente, auxiliando também a manter os sintomas da fibromialgia mais controlados. Essas medicações também promovem o funcionamento adequado dos neurotransmissores, alterando a percepção de dor e diminuindo a sensibilidade a estímulos.

Já a psicoterapia pode ajudar não apenas na regulação emocional como também na ressignificação da dor, bem como nas transformações que a pessoa passa depois do diagnóstico, permitindo a elaboração dos sentimentos referentes ao diagnóstico.

A prática de exercícios físicos é importante tanto para a saúde mental quanto para o tratamento da fibromialgia. Mesmo que as dores possam limitar um pouco as possibilidades de exercícios, é importante manter-se em movimento.

Psicoterapias para fibromialgia

Diversas terapias podem ajudar no tratamento da fibromialgia. No entanto, algumas das terapias com maior número de evidências são:

Terapia cognitivo-comportamental (TCC)

A terapia cognitivo-comportamental é um tipo de psicoterapia que tem como objetivo a identificação, monitoramento e modificação da atividade cognitiva, trabalhando diretamente com os pensamentos, emoções e as respostas fisiológicas que uma pessoa tem.

A dor é percebida como um fenômeno com componentes físicos, comportamentais e cognitivos. É justamente nos componentes cognitivos que essa terapia trabalha, ajudando também a trabalhar o comportamento como consequência.

De acordo com os fundadores da TCC, existe uma ligação entre as emoções, os comportamentos e os pensamentos. Por isso, trabalhar o conteúdo dos pensamentos pode ajudar a combater efeitos indesejados no emocional e no comportamental.

Para a TCC, existem algumas distorções cognitivas que podem ajudar na manutenção dos sintomas psicológicos e, consequentemente, piorar os sintomas da fibromialgia. As distorções cognitivas podem ser definidas como pensamentos que não representam a realidade, que geralmente tendem para uma visão mais negativa da situação.

Um exemplo de distorção cognitiva é a catastrofização, na qual o indivíduo assume o pior cenário possível como a realidade ou uma possibilidade muito grande, gerando bastante angústia e ansiedade. Em outras palavras, uma pessoa que sofre de fibromialgia pode, ao catastrofizar, pensar que sua vida está acabada por conta do transtorno, pensar que nunca mais conseguirá fazer as coisas que gosta por conta da dor, entre outros.

No entanto, esses pensamentos não são realistas, pois existem tratamentos e adaptações que podem ajudar a pessoa a recuperar sua qualidade de vida e continuar indo atrás de seus objetivos mesmo com o diagnóstico de fibromialgia. Contudo, ao pensar dessa forma, isso acaba gerando desconforto emocional, que por sua vez tem impacto direto na fibromialgia.

A TCC possui uma série de técnicas e exercícios que ajudam a pessoa a desafiar esses pensamentos distorcidos, evitando suas consequências emocionais.

Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT)

A terapia de aceitação e compromisso (ACT) é usada para o tratamento de diferentes tipos de dores crônicas de forma eficaz há anos, e também pode ajudar pacientes com fibromialgia.

Um dos pilares da ACT que ajuda no caso de dores crônicas é a flexibilidade psicológica, um conceito que permite um contato direto e consciente com o momento presente, evitando julgamentos e a identificação com pensamentos catastróficos que pioram sintomas psicológicos.

Na ACT, utiliza-se da aceitação e do mindfulness para alcançar essa flexibilidade psicológica.

A aceitação consiste em aceitar as coisas como elas são, ao invés de comparar constantemente com o que poderia ser. No caso de uma pessoa com fibromialgia, a aceitação envolve a compreensão o diagnóstico e suas implicações, a aceitação de novas limitações, para que assim a pessoa consiga identificar outras maneiras de alcançar seus objetivos e viver de acordo com seus valores.

Já o mindfulness, conhecido também como atenção plena, ajuda a pessoa a manter-se no momento presente, evitando envolver-se com pensamentos que trazem um julgamento sobre um futuro ruim, em que a dor está constantemente presente. Esse exercício pode ajudar muito nos dias em que os sintomas da fibromialgia estão menos intensos, pois preocupar-se com um futuro em que eles estarão mais intensos causa desconforto emocional, podendo aumentar as chances de intensificação das dores.

A ACT também pode ajudar a tratar outras preocupações e questões não relacionadas à fibromialgia, mas que podem estar alimentando os sintomas, como eventos traumáticos, outros sintomas psiquiátricos, entre outros.

O tratamento psicológico pode ajudar bastante pacientes com diversos problemas físicos, incluindo a fibromialgia. Se você ou alguém que você conhece convive com esta síndrome ou está apresentando sinais de problemas emocionais, não hesite em contatar um profissional da saúde mental!

Referências

https://www.estadao.com.br/emais/bem-estar/fibromialgia-e-o-lado-emocional-como-a-saude-mental-influencia-os-sintomas/
https://www.medley.com.br/saude-e-bem-estar/saude-mental/artigos/fibromialgia-e-depressao
https://drauziovarella.uol.com.br/reumatologia/como-a-fibromialgia-afeta-a-saude-mental-dos-pacientes/
https://www.proceedings.blucher.com.br/article-details/transtornos-mentais-em-pacientes-com-fibromialgia-37196
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-32692021000100007
https://www.scielo.br/j/rdor/a/8MTYYzzsdrrKyTsZ7VKm3St/
https://oasisbr.ibict.br/vufind/Record/UNILASALLE_1020d6df030295ff05b8c11eedeaa747
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2214782922000689

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